quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

A câmara criogénica

Quando faltavam 7 minutos para acabar o jogo e estava 2-1, já convencido de que ia acabar assim, pois ambas as equipas estavam satisfeitas, pensei: «Excelente resultado.»

Quando o Benfica fez o 2-2, saltei, claro – pois emocionalmente o único resultado realmente bom para um benfiquista é uma vitória, sempre e em qualquer situação, é para isso que estamos treinados como adeptos… – mas quando me sentei torci o nariz.

Quando o Zenit fez o 3-2, depois de engolir o travo amargo, pensei: «Excelente resultado.» Como é evidente, pois se o 2-1 era excelente, o 3-2 é ainda melhor.



Posso dizer-vos exactamente o dia em que comecei a desconfiar dos empates fora, com golos, nas competições europeias: foi no dia em que o Benfica foi eliminar o Arsenal, a Highbury, por 3-1, depois de empatar a 1 em casa (jogo na Luz antiga a que assisti ao vivo).

E também vos posso dizer quando é que confirmei a sensação que tive nesse dia: quando, em 1994, o Benfica foi empatar 4-4 a Leverkussen depois de ter empatado a 1 em casa.



Quando a primeira mão é fora de casa, prefiro perder 2-1 a empatar 1-1, e prefiro perder 3-2 a empatar 2-2. E explico porquê.

O mais importante para uma equipa numa eliminatória europeia é entrar em cada jogo a saber ao que vai, e não há nada mais contra-natura para uma equipa do que entrar num jogo em casa a defender um resultado. Quando se está a falar de equipas de primeiro nível isso não é problemático, porque essas equipas (os Barcelona, Real Madrid, Manchester United, Milan, etc) só o são porque, historicamente, conseguiram esbater o factor casa/fora e jogam praticamente sempre da mesma maneira. Mas em equipas como o Benfica ou o Zenit, para quem o factor casa é quase sempre decisivo nas competições europeias, a ordem natural das coisas, que manda atacar em casa e defender fora, impõe-se. Ir contra isso mexe-lhes com o ADN.

Para o Benfica, entrar para a segunda mão sem saber se (e sobretudo como) deveria defender ou atacar, e onde é que começava e acabava um bom resultado, poderia ser mortífero – ainda me lembro de uma eliminatória em que o Benfica foi ganhar ao PAOK, à Grécia, por 2-1, e na segunda mão, cá (o treinador do Benfica era o Heynckes e jogava o Sabry no PAOK), teve de ir a prolongamento para os eliminar.

Uma eliminatória não é dois jogos, é um, e estamos no intervalo. Uma equipa que entra para a segunda parte sem ideias claras, contra outra que sabe perfeitamente e que vai mentalizada para o que tem de fazer (e qualidade para o fazer, esclareça-se) fica imediatamente numa situação de inferioridade, a começar pela iniciativa, que é um factor preponderante numa eliminatória tão equilibrada como esta



O 3-2 resolve uma série de problemas ao Benfica e ao Jesus.

Os jogadores sabem, com duas semanas de antecedência, que têm de jogar para ganhar na Luz. Ou seja, aquilo a que estão habituados e treinados para fazer. E sabem que sofrer um golo não é determinante, o que é igualmente importante, porque o Zenit vai marcar na Luz - tal como o Gil Vicente,o Feirense, o Guimarães, a Académica, o Nacional, todos menos o Sporting... - e convém, nessa altura, não entrar em parafuso.

O Jesus sabe com quem é que tem de jogar, porque também sabe que Zenit vai ter na Luz: o mesmo Zenit do Dragão, a defender muito e a jogar para o empate.



Por tudo isto, reafirmo: não é perfeito, porque perfeito seria ganhar 3-0 e poder meter os suplentes todos a jogar na 2.ª mão, mas é um resultado excelente.

Algum benfiquista lúcido, nas condições em que o jogo é jogado, rejeitaria uma derrota por 3-2 antes da partida? Claro que não.

Já sei que alguns de vocês vão dizer que sim, mas tudo bem, temos todos a mesma doença, só a vivemos de maneira diferente.

Se sabe a pouco ou sabe a muito é irrelevante: ficar à distância de uma vitória por 1-0 ou 2-1, na Luz, com o Zenit, para passar aos quartos-de-final da Liga dos Campeões é praticamente tudo o que, realisticamente, o Benfica poderia desejar. Nem a passagem teria a mesma graça se bastasse um empate. Com empates em casa em jogos decisivos não há realmente grandes noites europeias.



Quanto ao jogo em si, assisti a uma exibição espantosa do Benfica. Não sou, ao contrário do que se possa pensar, um utópico. Sei o que espero do meu Benfica, mas sei também, perfeitamente, que não é razoável esperá-lo já, nem tão cedo. Mas hoje fiquei espantado. E afogado. Durante a segunda parte olhei para o relógio a pensar que ia a meio e ainda só tinham passado 7 minutos.

O adversário, o cenário, o campo e o contexto foram de uma exigência brutal, e a equipa respondeu perfeitamente à altura. Ouso dizer (penso estar a repetir-me em relação ao que já referi na fase de grupos, mas ainda assim digo-o) que, com este jogo em São Petersburgo, a equipa do Benfica mostrou que está mentalmente preparada para jogar na Europa. Falta-lhe qualidade, evidentemente, não é com a maior parte destes jogadores que se pode chegar muito longe contra adversários melhores, mas o enquadramento mental está lá. Se o mantiver e se rechear o corpo da equipa com mais talento, o Benfica terá subido, definitivamente, para um patamar europeu onde já não se encontrava há décadas.



O Benfica fez tudo bem. Defendeu como devia, atacou como devia, jogou o jogo como se impunha que jogasse. Alcançou o primeiro objectivo aos 20 minutos, marcando o seu golo, e o segundo objectivo depois do 2-1 do adversário, segurando o jogo e não deixando fugir a eliminatória quando teria sido relativamente fácil abrir uma desvantagem de mais um ou dois golos, a vinte minutos do fim.

Não vale a pena dramatizar os golos do Zenit. Tal como eu tinha dito, aqueles são os golos de uma equipa habituada a atacar em casa. Há muito trabalho para chegar até lá e para ter a bola jogável em situação criativa, mas, depois, a parte inventiva sai naturalmente – como a do Benfica vai sair na 2.ª mão. Aquele segundo golo o Zenit marca-o ao Benfica, ao Lokomotiv de Moscovo, ao Rio Ave lá do sítio ou ao Barcelona. É uma jogada que o Zenit só faz em casa – porque aí está habituado a jogar no meio-campo adversário, porque os seus jogadores se conhecem e passam a maior parte do tempo a atacar, porque é um esticão que sai do ritmo normal do jogo, etc, etc. O terceiro a mesma coisa.

Foi o factor casa (e não o frio, note-se, como eu também tinha dito há uns tempos) que derrotou o Benfica, não a equipa do Zenit pelo seu valor superior.



Grande jogo do Maxi, um jogador a diesel feito para este tipo de terrenos em que não tem de apanhar com mudanças de velocidade. Falhou no terceiro golo? E então? Submetidos àquele tipo de esforço durante 90 minutos, todos os jogadores falham.

Espantoso jogo defensivo de Aimar. Não se preocupem muito com a ausência no segundo jogo. Não vai ser por aí. Muito pior seria ter ficado sem Garay, Luisão ou Artur. E assim sabemos que joga os 90 minutos com o Porto.

Meio-campo, de resto, em grande nível, incluindo Matic, cuja capacidade de passar a bola depressa e à distância desmontou, à nascença, várias situações de pressão do Zenit a meio-campo.

O Emerson, mais uma vez, foi o elo mais fraco. No segundo golo, não fecha o meio. No terceiro, perde a bola na saída para o ataque. Poder-se-ia dizer que era azar, como foi a do Maxi, se não tivesse acontecido umas 6 ou 7 vezes. Acabou por compensar com um dos seus pontos mais fortes: a resistência física, que lhe permitiu aparecer em velocidade na área contrária fazer o centro para o segundo golo do Benfica aos 85 minutos de jogo. O Emerson vai acabar a época como o segundo ou terceiro jogador de campo mais utilizado pelo Jesus, e isso é uma coisa duplamente notável. É fraquinho? É. Mas só nos pés, porque no pulmão vale por um corredor.

«Cardozo para os livres e para encostar se ela aparecer em frente à baliza»… Ah, espera, isto foi o que escrevi na antevisão, quando se soube o 11…

Gostei de ver o Nolito com pressa para recomeçar o jogo a poucos minutos do fim. É mentalidade de clube grande. Vê-se que lhe está no sangue. É mais importante do que parece. É um jogador à Benfica. Poderíamos dizer o mesmo do Gaitán, por exemplo, mesmo sendo bem melhor jogador?



Uma palavra para o Rodrigo: não vai ser o único a ficar encostado ou pendurado pelo rabinho no jogo com o Vitória. Às vezes até parece que já vi o jogo antes, digam lá se não é?



O que eu mais desejava neste momento? Que, depois da câmara frigorífica que foi o Estádio Petrovski houvesse uma câmara criogénica dentro do avião, no regresso, para onde os jogadores entrassem, que lhes permitisse apagar, quer dos músculos quer do sistema nervoso tudo o que aconteceu nos últimos dois dias.

Como se nada tivesse acontecido e a única coisa que existisse fosse o jogo de segunda-feira contra o Vitória de Guimarães, que é muito mais importante e vai ser muito mais desprezado que este da Rússia na época do Benfica.

Bah…



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8 comentários:

  1. Boa exibição do Benfica. Aquele terceiro golo é que foi injusto.. e escusado. Fiquei com uma azia enorme, mas nada que não passe com o tempo (o post também ajudou). Previ um empate ou até mesmo uma vitória, e apesar de termos perdido penso a equipa correspondeu às minhas expectativas, apenas faltou um pouco de sorte nalgumas situações.

    Gostei de todos, obviamente não gostei do Emerson e estava à espera de mais do Gaitán, no fim de contas já que o gajo não tem jogado nada de jeito pro campeonato sempre podia brilhar na Champions.

    Enfim, resultado positivo. Venha o Guimarães.

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  2. Concordo com tudo. Foram uns heróis. Quem critica os jogadores, que eu não faço, nunca jogou num campo daqueles. Eu já o fiz e sei que não é fácil manter o equilíbrio num campo duro como uma pedra de gelo, mas que os olhos e os sinais que envia para o cérebro dizem que é um campo fofinho de relva verdejante. Para mim estiveram todos bem, mesmo o Maxi e aquele passe estapafúrdio (culpa exclusiva do terreno).

    PS. Esqueceste de referir que o Emerson teve outro excelente centro que devia ter dado golo se o Cardoso não tivesse falhado.

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  3. Pois, azia há sempre que não se ganha – e eu, por exemplo, ainda não fui aos jornais para não a alimentar – mas às vezes, por mais que racionalizemos, não há volta a dar, a coisa corre mesmo mal em todos os sentidos. Não é este o caso. Racionalmente, se o Benfica vier a ser eliminado, será pelo segundo jogo, não por este.
    O segundo jogo em casa vai decidir a eliminatória a favor do Benfica.
    E perder, de vez em quando, até bom. Mantém o pessoal avisado. Fossem todas as derrotas tão boas como esta e a época seria fantástica.

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  4. O Frio e o terreno de jogo jogaram a favor deles, certo. Mas isso nao faz do que se viu uma boa exibicao. Mantenho tudo o que disse no comentario que escrevi no post anterior a este. De qualquer forma, temos mais que condicoes para passar, mas ha varias coisas que para mim sao mais importantes ou me dariam mais prazer do que passar aos quartos-de-final. A saber:

    - Fazer 7 pontos nos proximos 3 jogos do campeonato, de preferencia se os dois perdidos forem em Guimaraes;

    - Que a vitoria frente ao Porto seja devida ao Rodrigo mais que a qualquer outro jogador;

    - Que o Bruno Alves morra em campo.

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  5. Totalmente de acordo em relação aos dois primeiros pontos. Em relação ao terceiro, não. Não podia antes ser um AVC paralisante de todo o lado direito?
    Fora de brincadeiras de gosto duvidoso, já vi o Bruno Alves fazer muito pior. Desde que foi para a Rússia está muito mais contido. Vá lá saber-se porquê... Foi uma entrada rija, mas não violenta. Até me deu ideia que o Rodrigo se magoou na queda, mas posso estar enganado.

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  6. É verdade, a lesão do Rodrigo deu-se devido a ter caído desamparado, de grande altura sobre a anca e sobre pedra. Mas isso não iliba o Bruno Alves. Ele sabe bem o que fez e, pior, a intenção com que entrou a matar com clara intenção se intimidar e magoar. Ele sabe muito bem, porque joga lá, que caindo num terreno tão duro, dói muito. Aconteceu-me algumas vezes. Mas também tenho de dizer que passa depressa, se for apenas traumatismo.

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  7. Eu só gostei do resultado. Houve alguma sorte em ambos os golos do Benfica, que não sei se teriam acontecido com o guarda redes titular. A produção ofensiva foi, por isso, bastante abaixo do habitual. Em contrapartida, a defesa esteve bastante mal. Javi faz imensa falta.

    O Bruno Alves é o mais bruto dos caceteiros que produziram na escola de caceteiros dos corruptos. Por mim, gostava que lhe desse uma diarreia que o pusesse de molho aí uns 6 meses.

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  8. Obviamente a derrota nao é boa.Somos benfiquistas e, para nós, a derrota nunca é bom resultado. Mas reparem: nao tenho a mínima du'vida que se tivéssemos empatado a equipa iria entar no jogo da luz a pensar que já estava no papo e era só cumprir calendário... Assim o zenit, equipa fria, fodida mesmo, dava-nos uma lição à lá spalletti. Com esta derrota os jogadores estão com uma pressão positiva, ainda mais por se tratar de uma pressão champions, com todos os grandes clubes a ver ( nao é, gaitan ???)
    Sem esquecer que provavelmente iríamos perder um dos próximos três jogos fora : zenit, Guimarães e academica. Perdemos este, logo, nao perdemos mais nenhum! :D
    Quanto ao burro Alves vamos tratar de lhe fazer uma recepção ao seu nível e desejar que quando o jogo terminar ele esteja a chamar-nos os piores nomes que o seu vocabulário morcão lhe consiga providenciar...

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