terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

O Túnel do Amor

Ando estranhamente calmo. Talvez seja aquele bafo quente que antecede a trovoada. Mas sabemos que um Benfica-Porto se aproxima quando um bruxo de Fafe revela que uma feiticeira do Minho anda a trabalhar contra os jogadores do Benfica. Quando pensamos que já não há lugar para maravilhas destas, quando pensamos que o futebol está perdido, um Benfica-Porto devolve-nos a magia do Natal. Sim, afinal, agora e para sempre, há quem nos salve dos tecnocratas, das troikas de olhos azuis, dos Merkozis de alpaca, das ásáis, há quem nos meta um torresmo na mão e nos diga: «Toma. Come. O futebol é isto.» Olhamos, emocionados, e é o Gabriel Alves.
Quero o Gabriel Alves, o Rui Tovar e o José Nicolau de Melo a cobrir o Benfica-Porto, para tirar o som à televisão. Quero o Guarda Abel como guarda-costas do Pinto da Costa. Quero o Delano Vieira a enterrar sapos atrás de uma baliza e o Toni e o Jesualdo Ferreira a dar um carrinho de supermercado cheio de compras a um sem-abrigo. Quero o Eusébio sentado naquela cadeira da linha lateral, à saída da escadaria que vinha das cabines, no meu Estádio da Luz, e a bancada a aplaudir quando a bola ia ter com ele e ele a devolvia aos jogadores.

Quero ver o Octávio Machado a ser bombardeado por laranjas durante o aquecimento dos guarda-redes, e ele a rir, os 30 mil portistas no Terceiro Anel antigo, as bancadas a tremer com os pés a bater, e as bandeiras, os milhares de bandeiras, quando o pau ainda era permitido no futebol, antes de lhe tirarem a tesão – quero a minha primeira bandeira: «Benfica, Campeão Nacional 1983/84».

Quero ver outra vez o Chalana e pensar: «Vou ser como ele.»

Quero o meu jogo.

Quero ser outra vez pequenino.

4 comentários:

  1. 30 mil portistas ????

    Quem me dera ter conhecido esse futebol...
    Quando digo que nasci 40 anos atrasado, as pessoas riem-se, mas eu sinto o que digo...

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  2. Também ando estranhamente calmo e com uma grande fézada.Sinto que vamos ganhar o clássico.

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  3. Foi num Benfica-Porto do princípio dos anos 90, talvez logo em 1990, com o Eriksson como treinador. Isaías e Rui Águas marcaram pelo Benfica e o jogo acabou 2-2. O ataque do Porto tinha Domingos e Kostadinov, que marcou de penálty, salvo erro, e no meio-campo ainda jogavam Rui Filipe e André, entre outros. O Porto seria campeão nessa época. Posso estar enganado, mas penso que foi nesse ano que o Benfica chegou à final da Taça dos Campeões, eliminando o Marselha. A partir do lado do estádio onde hoje ficam os No Name Boys (nunca sei se é Topo Norte ou Sul), quase metade do Terceiro Anel e uma boa parte do segundo era de adeptos do Porto. Do lado do Terceiro Anel velho era só para sócios do Benfica. Nesse tempo ainda não havia cadeiras no Terceiro Anel, que levava para aí uns 60 mil lugares, se fosse bem cheio. Lembro-me de ter ficado espantado porque eu estava no Topo do lado oposto, por baixo de um dos ecrãs gigantes que deram tanto brado na altura, e tinha uma boa percepção da verdadeira dimensão daquela mole humana. Era um enorme lago azul no meio do vermelho. Fiquei impressionado, pela simples demonstração de fé na equipa que os adeptos deles tinham, ao ponto de meterem lá tanta gente.
    Por isso, quando me dizem que as claques são «fundamentais» para o futebol-espectáculo, eu rio-me a bandeiras despregadas. Nunca vi nenhuma claque organizada do Porto dar um espectáculo como aquele. Da mesma forma que nunca mais vi o Estádio da Luz a reagir instintivamente, num impulso, como um único organismo a gritar pelo Benfica, como naquelas tardes de domingo, em que ainda não havia futebol na televisão, e em que se via que o entendimento do futebol e o entendimento do que era o apoio à equipa era uma questão cultural, adquirida pelo hábito de quem ia sempre, todos os domingos, à bola. Speaker para pôr os adeptos a puxar pela equipa?! Espera aí, está-me a dar uma cólica de tanto rir. Tenho de parar por aqui.
    E isto não é história do «no meu tempo é que era a sério». É a verdade. O meu tempo foi então, foi agora e será no futuro, há coisas que mudam para melhor, outras para pior, mas, nesse aspecto, quem viveu sabe a diferença.

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    1. Claques... Pensar que já tive fascínio por essa merda... Mas também não podemos comparar as claques de hoje das dos anos 80 e inicio de 90

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