sábado, 31 de março de 2012

Gaitán-Robben, Cardozo-Aguero, Aimar-Özil...

Em nenhum momento em que tem a bola nos pés nenhum jogador do Benfica tem uma ideia de como a jogada deve acabar. Ou melhor, têm uma ideia: sabem onde está a baliza. Tudo o resto é fruto do acaso. Os jogadores do Benfica são muito melhores do que o que parecem.

O Gaitán tem muito mais futebol dentro dele do que aquilo. O Rodrigo também. O Witsel também. Não têm é treinadores para isso. Os jogadores do ataque do Benfica só têm uma dimensão: a sua. A dimensão colectiva que possam ter dentro deles, com o tempo, com Jorge Jesus, pura e simplesmente desaparece. Porque o que o Jesus pede aos seus jogadores de ataque é precisamente isso: que sejam imprevisíveis, que usem a liberdade para criar soluções. O Rodrigo, ao fim de seis meses, é um jogador muito mais individualista do que era no princípio.

O resultado disto, na prática, é que facilmente o ataque do Benfica se torna também unidimensional: jogador com bola olha para a bola, olha para a frente e começa a correr. Há escassas hipóteses do colectivo do Benfica resolver um jogo, no ataque, porque, quando o jogador procura a solução colectiva, ou ainda não está lá ou já passou. Porque o outro jogador, obviamente, está na sua própria dimensão do jogo, que raramente coincide com a dos outros.

Tudo o que não seja óbvio, simples ou sorte não está ao alcance de uma equipa assim.



Este é o estilo de ataque do Jorge Jesus. Mas é curioso que só é assim desde que chegou ao Benfica. Antes disso, mesmo no Braga, quer o ataque quer a defesa eram mecanizados ao pormenor. Não havia liberdade para ninguém. Fazia o que os americanos chamam de micro-management, controlava todos os movimentos de todos os jogadores até ao pormenor. Nunca cheguei a perceber se o Jesus mudou o chip só porque estava no Benfica, se foi por perceber que, contra as defesas muito cerradas que o Benfica tem de enfrentar, só poderia resultar assim, se foi por sentir que finalmente tinha matéria humana para jogar «à Barcelona» (ao Barcelona do tempo dele, não do actual, entenda-se). Mas a verdade é que mudou mesmo.



Este estilo de jogo não é necessariamente errado. Quando é executado por grandes jogadores, como é que se defende um ataque imprevisível, rápido e tecnicista? É praticamente impossível. Aí sim, entramos no plano teórico do «basta marcar mais um que eles», porque as probabilidades são as de ganhar quase sempre por 3-2, 4-2, 3-1…

É o que acontece com esta equipa do Benfica em 70 por cento dos jogos, com as equipas com menos categoria, de baixa rotação e com menos capacidade de aguentar a pressão. Com as outras, não, por uma razão simples: os jogadores do Benfica não são suficientemente bons e não se conhecem suficientemente bem para arranjarem soluções em conjunto.

O Barcelona de Cruyff que ganhou cinco campeonatos seguidos e a Taça dos Campeões, e onde o Jesus foi fazer estágio, tinha-os. Stoichkov e Romário, por exemplo. Mesmo assim, note-se, sempre no fio da navalha. Dois ou três desses campeonatos foram ganhos graças a falhanços dos concorrentes directos (o Real e o Corunha uma, com um penálti falhado no último minuto do último jogo do campeonato, a jogar no Riazor) e na segunda final da Taça dos Campeões, que marcou o fim da era-Cruyff, com o Milão, levou 4-0! (Repare-se, contudo, que a disciplina táctica dessa equipa do Barcelona não é comparável com a deste Benfica. Era muitíssimo superior, assim como a capacidade de passar a bola.)

Este tipo de futebol de alto risco é um futebol que rebenta com os nervos, mas que apaixona, é ousado, corajoso e é à equipa grande. O tipo de futebol do Porto, por exemplo, sempre foi ao contrário, defensivo, seguro, e por mais que ganhe não apaixona ninguém. Passa incógnito. O que é que se sabe na Europa sobre o Porto? Que ganha. Mas só os treinadores é que gostam de os ver a jogar. Para os adeptos o Porto é igual aos outros, não se distingue.



Para conseguir fazer nos outros 30 por cento de jogos o que faz nos mais fáceis, e com o Jesus, só há uma hipótese: ter melhores jogadores. E já não vou para Ronaldos, Messis ou Iniestas. Ter um Aguero em vez do Cardozo. Ter um Robben em vez de um Gaitán. Ter um Mata em vez de um Bruno César. Ter um Özil em vez de um Aimar. Ter um Yaya Touré em vez de um Javi García. Ter um Coentrão em vez de um Emerson. Por este último exemplo, apenas, se pode ver a que distância real se encontra (na minha opinião, claro) o Benfica de Jesus da equipa que ele (o Jesus) pensa que tem.



Mais um ano de entente Vieira/Jesus, na melhor das hipóteses, vai dar nisto: o Benfica perde dois titulares, compra três ou quatro, melhora o onze inicial, os jogadores conhecem-se um pouco melhor, alguns deles amadurecem (Rodrigo, a Charrua, o Witsel…), o Benfica começa a época na data normal, chega a Fevereiro mais fresco, passa da tal fasquia dos 70 por cento para a dos 75 ou 80, se tiver sorte alguns deles são os decisivos, o Porto perde o Hulk e fica com o TOC mais um ano, e dá um campeonato. Mais nada. E isto é na melhor das hipóteses, porque ninguém garante que o Porto sem Hulk será mais fraco, como equipa, que o Porto com o abono de família Hulk.



Quanto ao jogo, qual foi a novidade? Uma equipa com 60 minutos de jogo no pulmão, a desperdiçar posse de bola como se tivesse 120 e como se do outro lado estivesse uma equipa a treinar. Jogo relativamente seguro a defender e totalmente errático a atacar, incapacidade de segurar uma vantagem caída do céu aos trambolhões numa jogada idiota do defesa do Braga, uma equipa do Braga a jogar como o Feirense e inferior em todos os sentidos menos nos pormenores da organização e do colectivismo, jogada individual genial de Gaitán no minuto 92, já fora de tudo, com Bruno César a marcar o golo da sua carreira num momento de classe, fazendo o que tinha de ser feito de maneira precisa. O Benfica ganha da única forma que consegue ganhar um jogo com este grau de pressão: com uma coincidência de momentos individuais brilhantes. Que, por extrema felicidade (estrelinha de campeão?) chega no último suspiro. É Gaitán quem ganha este jogo, não nos iludamos. Os outros empataram-no – ele, em cinco segundos, ganhou-o. No limite. À messias. Como o povo gosta. Mas para termos uma equipa de nível europeu temos de o trocar por um Robben.

Fácil, não?

17 comentários:

  1. É pá, esqueci-me de falar do árbitro.

    Houve.

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  2. Também achei o jogo muito fraco.Estou totalmente de acordo em relação ao ataque.É confrangedor ver o Gaitan e o Witsel a chegar com a bola e terem que aguardar pois não tinham linhas de passe para o ataque.Medíocre,mesmo muito.Quero ver o que o catedrático vai fazer na CL.Espero que dê descanso a muitos jogadores pois a Champions está feita.Em Dezembro comentei aqui que precisávamos de extremos de raiz que dessem verticalidade ao ataque e um lat.esq.(o Capdevilla é muito superior ao Emerson).Assim não temos plantel para mais do que uma competição.E essa tem de ser o campeonato e quer-me parecer que começamos a perder este campeonato na Russia.Última palavra para o Maxi.Esteve em todo lado do campo.Até descaído para a esquerda apareceu(no 2ºgolo estava junto do 2ºposte).Que grande pulmão.O melhor em campo.

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    1. O Maxi é o maior, mas tem de arranjar outra finta. Aquela de meter para dentro em corrida pelo meio das pernas do defesa já está tão vista que até eu, aqui no sofá, consigo defender.

      Agora, de facto, com aquela pedalada, não podemos meter o maxi a jogar a defesa-direito e a defesa-esquerdo ao mesmo tempo?

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    2. Só para verem a qualidade do homem! Faz a mesma finta vezes sem conta e leva (quase) sempre a sua avante!

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    3. Deveria dar para clonar o Maxi.Claro que se o Real se fartar do Fabio nos aceitamos de volta : D

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  3. Hoje o Benfica acordou com o cu virado para a lua.Isto só acontece de vez em quando.Ou JJ esquece a CL e perceba que os lacostes vão levar a liga Europa a sério e portanto poderão chegar mt mais estourados até pela viagem que terão que fazer ou adeus campeonato.

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    1. Já disse, nem sequer mandava desligar o motor do avião: era Aimar e mais dez juniores, cinco expulsões voluntárias aos dez minutos, derrota por 3-0, deixava os miúdos trocarem as camisolas com os craques do Chelsea, para porem nos quartos do Campus do Seixal, e ainda vinham tomar banho a casa. Em quatro horinhas despachava-se o assunto.

      E ainda temos de meter o Garay numa câmara de oxigénio para o homem recuperar depressa. Senão, com o Javi a central em Alvalade, não só perdemos o centro da defesa como perdemos o meio-campo. Mesmo assim, sem ritmo, já vai ser muito difícil para ele entrar e jogar a alto nível. Vai ser um jogo de lotaria, completamente.

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  4. O Benfica parece conseguir jogar colectivamente no ataque, enquanto ha espaco. Basta aproximarem-se um pouco mais da area, e aquele ultimo passe, ou penultimo passe, ou remate que devia ser passe ou passe que devia ser remate, sai quase sempre muito mal. 'E confrangedor e revela falta de treino.

    Outra coisa que 'e ainda mais confrangedora 'e o facto de nao conseguirmos marcar um livre ou um canto em condicoes. Aimar ainda marca um mais ou menos bem de vez em quando, mas Nolito e Gaitan, nossa senhora. E digo que isto 'e ainda mais confrangedor porque a equipa, com este treinador, vivia muito da forca nas bolas paradas nos dois anos anteriores. O que se passou entretanto?

    Nao sei quem vai ser campeao. Muito depende do jogo que o Porto B fizer em casa no proximo fim-de-semana. Quanto ao Benfica, acho que nao vai ser feliz em Alvalade este ano. Pelo menos o Witsel nao levou amarelo e em principio teremos o Garay de volta. Continuasse o Capdevilla a titular e eu ate diria que tinhamos algumas chances.

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    1. Então e os cantos curtos que em cinco segundos vêm parar à linha de meio-campo?!! Meu, eu até dou cabeçadas na parede quando vejo os dois centrais e o Javi Garcia a subirem e a bola a nem sequer chegar à àrea.
      É só a coisa mais estúpida que existe no futebol.
      Quando vejo aquilo fico convencido que a explicação mais simples é a verdadeira: o Benfica não tem ninguém que consiga, realmente, marcar um canto bem marcado, já não digo sempre, mas duas vezes em cada três. Porque se não é isso é inexplicável.

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    2. Cantos curtos ou longos são uma demonstração incrível de falta de trabalho. Não acredito como os cantos podem ser tão mal marcados. Nisso nem o Aimar se salva.

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  5. Falta ali muitos fundamentos basicos inadmissiveis numa equipa pro.Eu punha os jogadores numa pelada num campo de 5 e com mini-balizas para treinar a circulação de bola e movimentações.Mas como disse JJ,ele só tem tido tempo para fazer recuperações dos jogadores.
    Para Londres colocava o Saviola.O rapaz precisa de jogar e que raio de mal fez ele para ser quase ultrapassado pelo Djaló nas opções?O seu problema na época passada foi não ter havido banco a altura e ter sido obrigado a jogar sempre.Agora por teimosia JJ deixa-no de fora só para mostrar que tinha razão.A teimosia e o egocentrismo do nosso tecnico são o seu grande pecado.Veremos o que aí vem e sobretudo o que vão fazer os de Braga frente ao patrão.Não me lembro de um jogo destes frente aos azuis em que tenham feito algo.

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    1. Se a memoria nao me falha, ha uns anos o Braga perdeu por 3-2 no Dragao, num jogo em que foi bastante prejudicado pelo arbitro. Tera sido essa a ultima vez que o Porto B dificultou a tarefa ao Porto.

      Mas este ano 'e diferente, este ano 'e cada um por si.

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    2. Eu, que muitas vezes vejo treinos do Benfica, digo-vos que eles nao fazem outra coisa que nao peladinhas.

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  6. Sobre o jogo de ontem, gostei da atitude da equipa. Quis sempre ganhar e nem as contrariedades que foi sofrendo diminuiram essa vontade. Ontem a equipa quis mais do que o Braga e por isso ganhou.

    Sobre a dimensão individual, concordo com a análise, embora pense que peca por algum exagero. Uma das coisas que me custa ver no trabalho do Jesus é essa mudança. Antes do Benfica, havia muito maior rigor na preparação da defesa e do ataque do que agora. Quando penso nisso, até me lembro de uma afirmação do Quinito, quando foi para os corruptos e disse que aquela equipa nem precisava de treinador. No Benfica também fica a ideia de que se trabalha pouco em aspectos de funcionamento como equipa (defesa, controlo da bola, p. ex.) e que portanto dispensa-se o treinador, excepto como guru e mentor espiritual.

    O jogo de ontem também mostrou que as escolhas do costume (Emerson vs. Cap ou Jardel vs. Miguel Vitor) são injustas e a equipa perda com elas. Infelizmente em Alvalade teremos o Emerson outra vez, nem que seja a central?!

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    1. Concordo.O Miguel Victor é mais técnico,mais rápido,melhor que o Jardel,mas pelos vistos tem menos 6cm que ele.Haja pachorra.

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  7. ganhar dinheiro com a corrupção façil , façil a vitoria do porto a 2.30 x50=115.....mas ha duvidas , não se deixem enganar...

    vasco leite

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  8. Às vezes (poucas), somos injustos com a equipa. Jogámos contra uma equipa, supostamente a melhor do campeonato ate então, que só jogava no contra-ataque. Ate na lixeira jogaram assim! É muito mais fácil jogar dessa forma: jogar (ou melhor, controlar) em 30 metros e depois mandar a bola prá frente, que o Lima resolve. Quais sao os riscos?! Nenhuns! VIVA O BENFICA que com quatro jogadores fora de forma ( Miguel Vitor- belo jogo-, cap, Rodrigo e javi) e com menos um durante muito tempo (Cardozo) levou de vencida o Porto b.

    Resumindo: FORÇA BENFICA CARALHO!!!!

    Ps: jogamos bom futebol. É verdade

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