sexta-feira, 9 de março de 2012

A questão das expectativas

Não me lembro de uma derrota tão brutal como a de há uma semana.

Penso que nenhum benfiquista está, ainda, em condições de compreender a dimensão histórica que ela teve. Por um lado, porque somos emocionalmente levados a negar essa dimensão, tal foi o impacto negativo e o choque que ela provocou. Por outro, porque a competição e o tempo relativizam tudo – entretanto, já se eliminou o Zenit, já se vão fazendo contas às hipóteses, já se olha para a frente, o que ajuda muito a não olhar para o que acabou de acontecer.

A verdade é que entre a importância desportiva, o contexto económico e de relação de forças em que nos encontramos e a forma como aconteceu (0-1, 2-1, campeonato no papo, 2-3 aos 82 minutos com um golo irregular, meu Deus, quantas vezes é que isto aconteceu em cem anos? alguma?) ainda não tenho estômago para olhar para trás e colocar tudo em perspectiva. Foi forte.

O que eu vinha dizendo ao longo do campeonato não muda por ele estar praticamente perdido. Sim, era um dos mais importantes dos últimos 30 anos. Sim, era um mano-a-mano. Sim, será muito importante para a correlação de força nos próximos anos. Se o Porto tivesse perdido este campeonato poderia ter sido muito problemático para o clube.

Por outro lado, lembro-me de ter escrito, quando tudo estava ainda mais em aberto e se falava com mais convicção de um potencial início de uma crise profunda do Porto, que não ia ser assim tão fácil. Os cenários em que o Benfica, ou o Sporting, ou ambos acabam com a superioridade do Porto em dois ou três anos, sempre foram, para mim, irrealistas. Mesmo que o Benfica ganhasse o campeonato este ano o Porto continuaria a ser o principal favorito à vitória no próximo, mesmo sem o Hulk. O Porto tem um avanço grande, em termos científicos, e bases sólidas. Todo e qualquer processo de decadência do Porto será lento. Numa primeira década dessa decadência (que vai chegar, disso não tenho a mínima dúvida, e até acho que já estamos a assistir a ela), o Porto continuará a ser a equipa que ganhará tantos ou mais campeonatos que os outros, entre 4 e 5 em dez anos. Com o Porto passar-se-á o mesmo que com a produção de petróleo: o problema não é o petróleo acabar, é não se conseguir produzir mais ou não se conseguir manter o ritmo de produção suficiente para satisfazer as necessidades de consumo. A questão é simples: o Porto está, já, formatado para viver com determinado nível de receitas, em que há uma grande influência do rendimento desportivo (por prémios de jogo e valorização de jogadores); o Benfica está a adquirir a capacidade de ter receitas sem ter tido um sucesso desportivo comparável. Quando o sucesso desportivo começar a inverter, ainda que ligeiramente, o que hoje é um equilíbrio relativo na aquisição de talento vai-se tornar num fosso de capacidade de investimento, com o Porto a perder receitas conjunturais que vai fazendo de estruturais sem o serem e com o Benfica a ganhar receitas conjunturais para juntar a receitas estruturais fixas e superiores. E assim se entrará num ciclo vicioso, em que o Porto, mesmo mantendo, durante alguns anos (não para sempre) uma supremacia científica, perderá progressivamente capacidade competitiva.

Já vai longa a conversa para dizer apenas o seguinte: ensina a mitologia que os dragões só existem para serem mortos, mas matar um dragão é sempre uma tarefa heróica, que leva mais tempo do que o que se julga à primeira vista.



Neste resumo do campeonato, quero voltar ao primeiro post que publiquei neste site, ainda em Agosto, em pleno Algarve, por pura maluquice, e a escrever só para desabafar, sem sequer pensar que alguns meses depois estaríamos neste ponto.

Nesse post, escrevi que, pela lógica, o Porto seria campeão este ano. Nessa altura o Falcão ainda não tinha saído, só o Villas-Boas. De qualquer forma, a saída do Falcão, por si só, não seria suficiente para tirar o favoritismo ao Porto. Estamos a falar de uma equipa que acabou com (quantos mesmo?) pontos de avanço sobre o segundo classificado e que fez toda aquela javardice que todos nós conhecemos muito bem e que já está descrita (enjoativamente…) no post.

Também escrevi que acreditava que o Benfica seria campeão APESAR de não ser o favorito, e que o seria por auto-depredação do Porto, e não por vir a ter um mérito especial.

Enganei-me em duas coisas. Por um lado, o Benfica foi fazendo melhor do que eu pensava, e subiu mais do que eu pensava. Por outro, o Porto não se consumiu tanto quanto julguei que viesse a consumir-se. Consumiu-se bastante – o bastante para se colocar praticamente ao nível do Benfica, que arrancou bem atrás – mas o retoque de Janeiro foi suficiente para recuperar uma vantagem, ainda que ligeira, ante a total ineficiência do Benfica no mercado de Inverno. A expulsão de Emerson no clássico foi o pormenor que fez o resto, e esse resto é (ou vai ser) história.



A minha frustração é, talvez, maior que a do comum benfiquista, porque, ao contrário (presumo) da grande maioria, que encarou os primeiros meses desta época como uma continuação da anterior, tal o descrédito em que a equipa caíra, eu, desde cedo, vi-os como uma realidade potencialmente em todo diferente. A época que o Benfica foi fazendo foi apanhando muita gente de surpresa, que começou a acreditar, mas a mim era mais como uma confirmação de uma especulação (fundamentada, acrescento) que eu tinha elaborado no Verão. Até à passada sexta-feira, com mais ou menos incerteza, estava tudo a correr como eu pensava que fosse correr. Só por essa razão fui apanhado completamente de surpresa pelo resultado. Digo, sinceramente, que se me perguntassem se eu acreditava que o Benfica poderia perder com o Porto eu não daria zero por cento, porque isso não faria sentido, mas daria uns 5 por cento de hipóteses de isso acontecer. E se estou brutalmente frustrado é porque ainda acredito que, na verdade, apesar de parecer um resultado normal dados os últimos anos, o que o Porto, sem saber bem como, conseguiu, nessa noite, foi bater uma probabilidade de 1 para 20, de ganhar este título.

Pode parecer (porque é o Porto) estúpido dizer que acho o Porto tinha as mesmas hipóteses do Rio Ave em ganhar aquele jogo, e que aconteceu com o Porto o que poderia ter acontecido com qualquer outra equipa do campeonato num dia de azar, mas é aquilo em que eu penso

(e isto não é desculpabilizar a equipa do Benfica, como bem se entende até pelo que já deixei escrito no fim-de-semana, porque o que se pede a uma equipa campeã é precisamente que esteja preparada para ganhar, com sorte ou com azar, os jogos QUE TEM MESMO de ganhar, seja contra o Porto ou contra o Feirense. Não todos, mas aqueles especificamente.)

Mas se digo isto é para dizer que esta frustração é o resultado da minha cabeça, das minhas conjecturas, não de uma visão pragmática.

Pragmaticamente, se eu não tivesse tido esse projecto – e devo dizer que eu NÃO SOU de fazer este tipo de projectos, vocês até podem pensar que sou porque só me conhecem há meia-dúzia de meses mas a minha visão do futebol é, normalmente, muitíssimo mais pragmática e menos voluntarista em termos de resultados –, o que eu veria como uma boa época para o Benfica, considerando o percurso das últimas duas, seria o seguinte:

- segundo lugar no campeonato, aumentando a competitividade da equipa, ficando a apenas um ou dois maus resultados de distância do Porto, conseguindo escapar à pré-eliminatória da Champions no ano seguinte e lançando, neste conjunto de factores, um favoritismo percentual para a próxima temporada, eventualmente com uma mudança de treinador que permitisse fazer a equipa evoluir técnica e tacticamente;

- apuramento para os oitavos-de final da Liga dos Campeões, que, em termos de desafio/capacidade de resposta, seria o lugar natural de eliminação desta equipa, que tinha algum potencial mas também pouca experiência europeia a sério;

- uma vitória na Taça de Portugal, mas apenas em caso de presença na final, ou seja, não vendo uma eliminação antes disso como um falhanço, até porque, normalmente, ela só acontece por questões de calendário e/ou sorteio.



Para metade dos benfiquistas isto é sacrilégio, mas considerando todo o contexto formado a partir do desempenho do Porto na última época, esta seria, para mim, e olhando para a temporada actual não como um evento delimitado mas como uma parte do processo de crescimento da equipa do Benfica, um passo em frente – mais um passo. Um passo não maior do que a perna, nem menor do que o que se poderia dar. Um passo do tamanho apropriado para quem está a aprender e para quem precisa de aprender, entre outras coisas, que não há atalhos para o sucesso e que não há sucesso sem paciência e sem capacidade de sofrimento.

Como referi há uns dias, tenho muitíssimas dúvidas – para não dizer que não tenho dúvida nenhuma – que ganhar um campeonato sem se ser o melhor em campo seja positivo, em termos de sucesso futuro, para qualquer equipa. O melhor deve ganhar. Parti da hipótese de o Porto decair mais rapidamente do que o seria de esperar e que, já este ano, o Benfica, sem estar ainda muito bem, já conseguisse ser a melhor equipa. A verdade é que não está a conseguir. E não deve ganhar, admito-o. Dói sempre abdicar de uma esperança, é sempre muito atraente pensar num Marquês do Pombal cheio, mas, racionalmente, se for para só para acontecer mais uma vez numa data de anos, prefiro esperar, e esperar que o Benfica, como clube, não deixe de acreditar no poder do trabalho.



É claro que, para 95 por cento dos benfiquistas, isto são balelas. Importa é ganhar, sendo bom, mau ou péssimo. (Aliás, como é evidente, se o Benfica fosse campeão este ano, mesmo por um bambúrrio, eu pegava na minha trouxa, ia para o Marquês, cagava de alto na racionalidade e ninguém me calava até eu perder a voz. Pensar? Amanhã. Mas isso faz parte da doença, certo? Também não nos vamos armar em sportinguistas…)

Ora, quais são as hipóteses racionais do Benfica ainda ser campeão este ano? (E digo isto admitindo que, acreditando, como acredito, só acredito porque, como benfiquista, me é geneticamente impossível não acreditar…).



Teoricamente, o Benfica está a dois maus resultados do Porto de ser campeão. Não é nada de extraordinário, a nove jornadas do fim, sobretudo se se considerar que nesta classificação de «mau resultado» se enquadram, por exemplo, dois empates. Isso é positivo. O Porto não tem de perder nenhum jogo para perder o campeonato, basta-lhe empatar um e depois empatar outro. Empatar em Braga, por exemplo, e empatar com o Sporting é algo de extraordinário? Não.

Mais complicado do que isso é o Benfica fazer a sua parte, que seria ganhar os nove jogos que faltam.

Por si só, fazer isso implicaria, já não contando com outras saídas complicadas contra equipas com a corda na garganta e a jogarem empastilhadas (Paços de Ferreira e Setúbal na última jornada), vir a ganhar a Olhanense (fora), Braga (casa) e Sporting (fora) no espaço de 15 dias, o que é uma valente dose. Se se considerar que precisamente no meio desses 15 dias o Benfica tem de jogar os quartos-de-final da Champions, é ficção. Se pode acontecer? Pode. Mas, na verdade, não pode.

E mesmo assim, para poder de todo, só acontecendo algo deste género: sair no sorteio o Barcelona ou o Real Madrid, as duas equipas (juntamente com o Bayern Munique) com as quais o Benfica não tem quaisquer hipóteses de passar, mas com a vantagem de a viagem praticamente não existir, em que só há verdadeiro desgaste psicológico na primeira mão, uma vez que na segunda, a meio da semana de Braga e Sporting, já está tudo decidido, sobretudo se a segunda mão for na Luz e não houver, sequer, viagem para fazer.



Assim seriam as três perspectivas ideais possíveis para três tipos de benfiquista:

- O benfiquista «carrega Benfica!»

«Só o Barça e o Real é que são impossíveis. A qualquer outro podemos eliminar. E por que é que não podemos ir ganhar a Alvalade? Se ganharmos os jogos todos somos campeões, e quem não acreditar não é bom chefe de família. Carrega Benfica!»;



- O benfiquista «vocês não são benfiquistas a sério»

«Sai-nos o Marselha, ou o Nápoles, ou o APOEL, e ainda temos estaleca para chegar as meias-finais e sermos campeões se o Porto der uma abébia ou, pelo menos, ficar em segundo, porque ganhamos de certeza ao Braga e vamos pelo menos empatar a Alvalade.»



- O benfiquista chato do blog, que pensa que sabe das coisas

«O campeonato está perdido e os jogadores e treinadores têm de ser pragmáticos. O jogo da época agora é o jogo com o Braga, porque se ganharmos esse o segundo lugar não escapa e temos de apostar tudo aí. De outra forma, caímos para terceiro, temos de começar outra vez a época um mês antes dos outros e fica tudo estragado, como este ano, em que nos acabaram as pilhas em Janeiro, sobretudo se o Jesus ficar porque aquilo para queimar os homens é pior que o napalm. Se passarmos às meias provavelmente já não temos de vender o Javi Garcia este Verão, e seria mais um trunfo, mas se vier o Barça ou o Real provavelmente é melhor porque sempre saímos em beleza e sem gastar muitas energias (desde que esse não seja o tal dia em que o Messi decide marcar os seis golos, como disse o Guardiola…). Chato mesmo é a meia-final da Taça da Liga. Mais valia não voltar a olhar para o focinho daqueles cab…, mas também, somos capaz de ganhar porque os árbitros, quaisquer que sejam, vão querer compensar a merda que fizeram, e para os propagandistas do Porto até convém, para poderem dizer ‘não, não, estão a ver, os erros tocam a todos e os árbitros também têm direito a errar’.»



Claro que isso seria querer comparar o crepúsculo com o cabelo crespo do cú… mas se calhar já estou a avançar em demasia. Ganhar ao Paços de ferreira, este domingo, já será suficientemente complicado.

10 comentários:

  1. Quando acabo de ler um post teu fico deprimido.. Só de pensar que com Fabinho, salvio e c. Martins (como é que vocês nao se indignam pela saída do único 10 capaz de subistituir Aimar ?!!!) tínhamos o campeonato no papo, a champions nao sei, mas provavelmente, independentemente de quando formos eliminados, faríamos melhor figura( mesmo que ganhemos a champions (intervalo para se rirem) ganharíamos a final com goleada...
    Quanto a taça de Portugal seriamos na mesma eliminados pela simples razão que tanto tempo sem perder, quando a derrota chega, tem que dura ou decisiva ( neste caso foi as duas...)
    A taça da cerveja é a taça do Benfica e nos vamos ganhar aos morcões. É pura matemática

    ResponderEliminar
  2. Pois eu ainda estou de luto.E com desejos de vingança.Vou meter uma cunha ao Boi para acagaçar o Pentes Proença...Agora a sério não estou a queixar-me somente das arbitragens mas este gajo vai aí no 7ºjogo em que prejudica à descarada o Benfica e em algumas veio no dia seguinte pedir desculpa,etc e tal.Não consigo esquecer.

    ResponderEliminar
  3. Mas qual prejudicar o Benfica à descarada?! Preferem viver enclausurados na vossa "verdade" do que ver a realidade? Ainda bem, melhor para nós. Erros do árbitro? O offside no 2-3 e o penalty com as mãos do Cardozo qual Harlem Globetrotter. Não é por repetirem muitas vezes a mentira que o Witsel sofreu falta no 2-2...

    ResponderEliminar
  4. Só por má fé alguem pode dizer que Cardozo faz penalty ou então nunca jogou futebol.Faz me lembrar um sujeito num outro blog que jura que Yebda fez penalty.Mas o mais importante é o jogo em Paços e o resto é treta.Mesmo a jogar mal e não sendo os melhores seria fundamental ser campeões esta época pois impediria pela 1ª vez em 18 anos que os porcos fizessem um Bicampeonato.Se bem me lembro Adriaanse foi campeão sem deslumbrar mas foi o inicio e o alicerce de 4 anos a ganhar.Se Koeman não tivesse desprezado o campeonato...
    No final teremos obviamente que evoluir e mudar o tecnico.Manter o bom que trouxe e melhorar no resto.Criar uma entidade no clube de vencedores ou como diz o autor de caçadores/predadores sempre em busca de mais uma vitória qual equipa esfomeada.

    ResponderEliminar
  5. Este andrade só vê de um olho, ou do olho errado. O "penalty" do Cardoso é igual ao penalty do Maicon, bola na mão. Para marcar um, marcava o outro.

    Há outros erros tão graves, mas não tão decisivos, como o off-side que afinal não foi. Igual ao offside de 2metros do Hulk do ano passado que lhes pemitiu ganhar na Luz no jogo na Taça. Quase a papel químico e com as mesmas funestas (para a verdade desportiva) consequências.

    ResponderEliminar
  6. ahahah Manuel... mostra lá esse penalty. o do Cardozo está aqui para toda a gente ver
    http://www.youtube.com/watch?v=n-kij_PIycE
    anónimo, só por má fé?????
    -com as duas mãos até!
    -bola vem do canto e não sofre nenhum desvio!! (ou seja, não é à queima);
    -Braço aberto a ganhar volumetria impedindo o decurso natural da bola;
    -ainda a aconchega com o outro braço
    -para finalizar, a bola não ia propriamente para fora ou para a cabeceira da área. Ia direitinha ao Janko, só por acaso o nosso PDL, em plena pequena área em frente à baliza, provável situação de golo iminente.
    Mas pronto, é como falar para um muro. Manuel, maldito fora de jogo esse. Porque ainda hoje não se calam com isso e tiveram um penalty ridiculo para ver se não arrumavam. 2 metros? lol tenho pena de ter marcado assim porque como tavamos a jogar era questão de tempo, já tinha entrado o primeiro ia ser sempre a aviar.

    ResponderEliminar
  7. http://www.youtube.com/watch?v=R0XZCGukU_g&feature=related
    se é disto que falas, tá tudo dito. acho que podemos concordar que tenho razão. não precisas de pedir desculpa, às vezes a paixão futebolistica cega-nos

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Hugo nao da para banires este merdas ?!

      Eliminar
    2. Ninguém será banido deste blog. A não ser os árbitros, que fazem mal à saúde.

      Eliminar
    3. Mas eu por acaso faltei ao respeito a alguém? Ou apenas iniciei um debate saudável e argumentei sempre o que disse, e até com provas vídeo?... Ou é só a verdade que faz comichão?

      Eliminar