domingo, 25 de março de 2012

«Ganhar o campeonato» ou «não perder o campeonato»?

Ora bem, como deve ter reparado foi um fim-de-semana de absentismo – ao que a frustração. Obviamente, também ajuda.

O funeral de sexta-feira pôs o pessoal aos berros, como é óbvio, e levantaram-se algumas questões pertinentes, às quais vou tentar fazer o contraditório, (de forma necessariamente sucinta, como é claro, pois cada uma, por si só, daria um longo post).



1 – A não-descida dos clubes

Antes de mais, não concordo totalmente com a leitura de que o Olhanense só tenha destruído, mas pronto, até dou de barato, porque não é assim tão relevante.

Primeiro ponto: uma equipa mais fraca, aqui, em Espanha, na Turquia, na América e no Azerbeijão, a jogar contra uma equipa em que o ordenado de um jogador do adversário chegaria para lhe pagar a temporada inteira, vai sempre tentar arranjar subterfúgios para nivelar o campo.

No desporto americano as hipóteses são menores, mas também há: há equipas que apostam na agressividade, em sistemas de jogo revolucionários, em esquemas estranhos.

No futebol, uma vez que o empate é premiado e o anti-jogo é permitido, é o anti-jogo que se pratica. Essa é uma questão mais do jogo em si que do formato de competição, e só pode ser resolvida de duas formas: ou coerciva, aplicando novas regras, ou progressiva, pela educação. Na primeira pode-se, por exemplo, implementar o tempo jogado em vez do tempo corrido, eliminar o empate, e muitos outros esquemas que o International Board (ainda) não permite. Na segunda, espera-se que as pessoas percebam que o anti-jogo lhes tira dinheiro ao fim do mês porque leva as pessoas a não irem ao futebol. Não há é muita gente que esteja disposta a perceber e a explicar isto aos jogadores e aos treinadores – aos verdadeiros profissionais do futebol.

Segundo ponto: como é que o jogo de sexta-feira justifica o sistema actual? Não percebo. Algumas questões: O Olhanense, já sem precisar dos pontos, competiu ou não competiu ferozmente? O Olhanense teria jogado de outra forma se estivesse a lutar para não descer? A propósito de quê? Então sem, sem ter nada a perder, jogou a defender, para fazer o ponto, o que é que teria feito de diferente se jogasse para o ponto precisando dele? Não teria jogado tão ou mais na retranca, considerando que, pelos vistos, é assim que o Sérgio Conceição achou que conseguiria não perder com o Benfica?

O Olhanense, provavelmente com um prémio chorudo do Porto por baixo da mesa – como o Nacional contra o Porto na semana passada, por certo… –, jogou para o empate. E então? Provavelmente continuaria a jogar para o empate se não houvesse descidas. Um campeonato fechado não acabaria com estas situações, como é evidente. Nem eu disse que acabaria. Elas são sistémicas. Mas um campeonato fechado, com o tempo, criaria um clima de jogo pela positiva, e não pela negativa, quanto mais não fosse porque, num campeonato fechado, só há uma direcção para onde olhar: para cima. Agora, os medíocres sempre existiram e sempre existirão. Simplesmente teriam menos espaço para prosperar, porque passaria a ser a ambição a dar o tom, e não o fado do desgraçadinho que ouvimos a 90 por cento dos clubes logo em Agosto. Fechar o campeonato não transformaria o futebol português num paraíso do ataque, da positividade e do fair-play, mas concerteza tiraria muita razão de existir à negatividade que se vê, sobretudo, nos jogos entre equipas equilibradas – esses sim, uma verdadeira bosta de jogo, na maior parte das vezes, porque se passa a maior parte do tempo a jogar para o pontinho. O meu argumento a favor de um campeonato fechado não está no Olhanense-Benfica, que tem sempre muitas gente a assistir – está no Olhanense – Rio Ave, que tem 500 pessoas, e todas elas aborrecidas ou que só lá vão para chamar nomes ao árbitro.



2 – A extensão dos plantéis

Uma questão interessantíssima e muito propensa aos mitos e aos chavões.

Chavão: «Temos dois jogadores para cada lugar.»

Facto: Não é verdade. Nenhuma equipa do mundo tem dois jogadores de valor igual para cada posição, e isso seria completamente estúpido, porque seria um desastre económico e desportivo. A última vez que me lembro de isso acontecer foi quando o maluco do Berlusconi tinha, no Milão do fim dos anos 90, onze jogadores para o campeonato e outros onze para a Liga, ganhando em ambos, e mesmo esse só durou dois anos.

Em todas as equipas há os bons e há os melhores, e quem joga são os melhores.

O que nos leva a segundo chavão: «Temos alternativa à altura dos titulares.»

Facto: falso, em 99 por cento dos casos. É raríssimo um suplente ser tão bom como o titular. Aliás, em muitos casos, o suplente directo, chamemos-lhe assim, nem sequer substitui o titular do seu lugar. Temos assistido a vários casos este ano, por exemplo, no Benfica e Porto em que é uma espécie de suplente de segunda linha com mais ritmo ou mais qualidade que o suplente directo do lugar, mas de terceira linha, que substitui o titular. Veja-se os casos da lateral-direita ou dos extremos  no Benfica e no Porto.

Chavão: «Temos um plantel suficientemente profundo para encarar com optimismo todas as competições.»

Facto: um plantel pode ter 17 jogadores de campo do mesmo nível médio-alto e 3 acima da média, mas se, nos jogos decisivos, um, dois ou mesmo os três jogadoresd acima da m+edia não jogarem, as suas hipóteses de sucesso são praticamente nulas, por mais jogadores médio que o treinador tenha para meter no onze. No Barcelona, toda a gente sabe jogar bem, mas se o Barcelona jogar as meias-finais da Liga dos Campeões sem o Messi, o iniesta e/ou o Xavi as suas hipóteses de ser campeão europeu desceriam de 80 por cento para 15.

Tudo isto deveria levar a uma maneira diferente de construir os plantéis, mas a verdade é que ter 20 jogadores de campo parece continuar a ser uma regra sagrada para todos os treinadores. Lá mais para o Verão, certamente, iremos falar muito disto.

Deixo só uma questão no ar: entre o que se paga de ordenado ao Capdevilla, ao Jardel e ao Miguel Vítor não se conseguiria pagar a um defesa que fosse melhor do que qualquer um dos três e que fizesse mais minutos que os três juntos, capaz de pôr o Emerson no lugar que merece – o banco? Pois…



3 - Uma «equipa-campeã»

A questão não é ganhar ou não ganhar o jogo. Arrisco mesmo a dizer que a questão não é ser campeão ou não ser campeão. Pode-se empatar um jogo como o de Olhão por duas razões: ou por se fazer as coisas bem feitas e não ter a sorte do jogo (o que pode sempre acontecer) ou por não se saber como ganhá-lo. Da mesma forma, pode-se ser campeão empatando um jogo como o de Olhão por não se saber como o ganhar – não se pode é esperar que a chuva caia sempre no nabal enquanto o sol está na eira. Acontece uma vez ou outra. Depois passa. Não me parece que comparar o Benfica ao Real Madrid seja relevante. O Real Madrid do ano passado, por exemplo, já sabia como ganhar, apenas ainda não tinha a qualidade suficiente para o conseguir. Mas já era uma equipa que, se não tivesse apanhado aquele Barça, teria sido campeã facilmente. Tinha a ciência para isso. No entanto, não o foi. Diferença este ano, nem sequer é o que o Real Madrid está a fazer, mas o que o Barcelona está a fazer. E o Real será campeão.



4 – E em relação a isto…

Agora, que o Porto acabou de empatar, convém dizer que isto não altera a minha leitura do jogo de sábado, nem em relação à capacidade da equipa do Benfica nem em relação às suas possibilidades de ser campeão (tristemente, confesso) – pelo contrário, só confirma a minha leitura de que qualquer semelhança entre este Porto, sofrendo o empate a 10 minutos de se sagrar virtualmente campeão, e o Porto-campeão dos últimos anos, é pura coincidência ao nível da corda camisola. Displicência, falta de agressividade, falta de jogo colectivo (tudo isto em termos relativos, entenda-se), uma sombra de uma equipa campeã.

Quanto ao título, não confundamos fé com racionalidade. Acreditar, nenhum benfiquista deixa de acreditar, por mais funda que a crença esteja. Mesmo se o Porto tivesse ganho continuaríamos a acreditar que o Porto podia empatar mais um jogo em casa, perder em Braga, perder com o Sporting, e por aí fora. Mas as hipóteses do Benfica, racionalmente, continuam a ser débeis. Ser campeão implica ganhar os 6 jogos que faltam. O eventual deslize que o Benfica podia cometer em Alvalade cometeu-o em Olhão. Vai ter de ir ganhar a Alvalade, ganhar ao Braga, ganhar os outros jogos todos e esperar, obrigatoriamente, que o Porto ou não ganhe em Braga ou não ganhe ao Sporting em casa.

Mas querem mesmo saber? Vou cometer um pecado. Este título, a acontecer, já perdeu muito do sabor que teria. Porque o facto do Benfica ser campeão não altera o que tenho visto a equipa fazer nestas semanas em que deveria ter mostrado o verdadeiro estofo de campeã. O que quero dizer é que não vejo mais, nesta equipa, além de alguma subida de qualidade e de experiência, do que o que já vi no primeiro ano de Jesus: um campeão ocasional.

Quase diria que o prazer que me daria ganhar este campeonato seria mais pelo que poderia significar em termos futuros, na desagregação do Porto, do que pelo campeonato em si, que é o mais renhido de que me lembro.

E eu gostava de poder escrever isto tudo ao contrário, acreditem.



5 – O verdadeiro benfiquista

Ser benfiquista não é apoiar quem lá está porque lá está. É preciso começar a enumerar algumas dezenas dos que lá estiveram, entre presidentes, treinadores e jogadores, e que não valiam a ponta de um corno? É suposto que eles ainda lá estivessem só porque lá estiveram em determinada altura?

Solidariedade não é dizer ámen. Dizer ámen contra a nossa consciência é NÃO SER benfiquista. Já disse e repito que ainda hoje lá tenho o título da Operação Coração guardado em casa, com muito orgulho.

Apoiei o Jesus quando ele manteve o Roberto até às últimas consequências. Era o que estava certo, na minha consciência.

Apoiei o Vieira quando ele manteve o Jesus a meio da temporada passada. Era o que estava certo, na minha consciência.

Provavelmente até o vou apoiar quando ele decidir manter o Jesus no final desta época, dadas as alternativas e a conjectura. Se isso estiver de acordo com a minha consicência.

O Vieira está a fazer um trabalho muito bom no Benfica. Quer conquistar-me definitivamente? Esqueça os árbitros, eleve a ética de trabalho no interior do clube, e, quando eu sentir que o Benfica fez tudo o que podia para ganhar e só não ganhou porque foi roubado, serei o primeiro a atirar um paralelepípedo à porta da FPF. Antes disso não.

O Jesus quer ganhar-me? Aprenda a ser melhor, caia em si, cresça com homem e como profissional, aprenda que o facto de ser iliterado não faz dele melhor que os outros, deixe-se de merdas, e eu vou para o Estádio da Luz pedir-lhe a chiclete. Se não o fizer, que vá corrido e o quanto antes, de preferência já hoje.

Os jogadores querem que eu os apoie incondicionalmente, mesmo irracionalmente? Dêem-me, dentro de campo, razões para pensar que não poderia desejar ser representado, como benfiquista, por outros que não eles. Joguem sem ser no limite da ambição e puta que os pariu, seja Emerson, seja Maxi, seja Luisão, seja Aimar.

Isto não faz de mim um  verdadeiro benfiquista? Pois se assim é, viva o Sporting e que se lixem os verdadeiros benfiquistas.

Se isto fosse lá pelo apoio incondicional e acrítico o Benfica era campeão da Europa todos os anos. Mas não vai.

4 comentários:

  1. Aleluia! Pensava que tinhas desaparecido.

    Ainda assim, como diz o RAP, fazem falta os fanáticos. Os que misturam fé com racionalidade. Sao, para mim, os mais genuínos.

    Se o Benfica conquistar o campeonato só sabe bem porque é uma derrota pesada para os morcões. Mas sei que nao somos superiores. E isso custa.

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  2. Na minha opinião não somos superiores porque continuamos a dar constantemente tiros no próprio pé. Quando tudo parece bem e encaminhado é da estrutura interna que surgem as confusões: no ano passado com o Roberto, este ano com o Emerson. No ano passado com o apoio ao F. Gomes, este ano com o apoio ao Figueiredo. Na altura em que devíamos protestar com as arbitragens (quando estávamos em vantagem e não pareceria desculpa de mau perdedor) e deixar bem vincado que estamos atentos cala-mo-nos (vejam o que fez a "estrutura fcp" quando perderam em Barcelos), quando nos roubam o campeonato, mais uma vez, em nossa casa, é que vimos para a rua fazer barulho. Apesar de sentir que houve claramente uma evolução, o nosso clube, infelizmente, parece que ainda é gerido de forma pouco profissional. Não existe um departamento de "risco" que anteveja todos os potenciais problemas, esquemas e dificuldades antes deles surgirem. Como o Hugo tem aqui defendido e bem, conhecemos as regras do jogo (viciado) mas não fazemos nada para jogar com as mesma armas (ou pelo menos contrariar), vide o apoio sistemático ao "amigo Oliveira". O que nos permite ainda sonhar com o campeonato este ano é o facto do fcp não estar lá muito melhor...vai ser claramente um campeonato vencido pelo menos mau e não pelo melhor. E nessa ordem de ideias, não sei se o menos mau não será o scbraga... Eu, como sou dos românticos fico satisfeito por, pelo menos amanhã, irmos vestir o fato de gala no clube dos grandes. Mesmo sabendo as consequências que isso poderá ter para o nosso desempenho na Liga. Um abraço.

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  3. Até vou mais longe do que tu: a partir do jogo da Luz com o Porto, e pela maneira como foi perdido, uma estrutura realmente competente teria começado a jogar, nos média, o campeonato do ano que vem. E teria cotinuado agora, em Olhão. Falo em termos operacionais, não éticos, pois continuo a não aceitar que (pelo menos entre os benfiquistas) se apresente o fora-de-jogo do Maicon como causa da perda do campeonato. Mas, dentro das regras do jogo vigentes, quando o campeonato começasse a opinião pública já iria esta de tal forma condicionada que o Benfica partiria em vantagem.
    A decisão do João Capela em Olhão é um caso claro de trabalho de condicionamento dos árbitros: é uma decisão rápida num contexto rápido, em que o julgamento resulta mais do subconsciente que da racionalidade. Para não expulsar o Aimar o Capela teria de estar tranquilo e de ter tempo para raciocinar. O mecanismo mental que o leva a decidir expulsar o jogador resulta do condicionamento subliminar. Aquela decisão, tomada num décimo de segundo, e que, em última análise, pode ter decidido um campeonato, levou meses, para não dizer anos, a ser trabalhada, por parte do Porto, na opinião pública - a que o Capela, obviamente,e por mais honesto que seja, não é imune.
    Quando digo que o Benfica já devia estar a jogar o próximo campeonato é também nisto. O Porto começou a jogar o campeonato do ano passado com 6 meses de antecedência, no dia do jogo do túnel. E colheu os frutos disso.
    Tudo isto é triste, e podre, mas é a realidade.

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