segunda-feira, 24 de outubro de 2011

A «situação Maxi»

Num clube como o Benfica – ou o Sporting, ou o Porto – que representa mais uma nação, com as características psíquicas e políticas que acabam por ser as que pertencem às nações (os laços culturais, o sentimento de pertença a uma história comum, etc), do que um clube, é um erro minimizar os gestos políticos e diplomáticos, e é um erro ainda maior não aplicar uma abordagem institucional a todas as relações com entidades exteriores – outros clubes, agentes de mercado, instituições nacionais e internacionais, etc.
A situação Maxi Pereira, na minha opinião, só tem duas alternativas teoricamente, porque, na prática, o único caminho que leva a efeitos, a longo prazo, positivos, é o segundo entre as que vou descrever.

Na primeira alternativa o Benfica faz de conta que não está a ser chantageado e ridicularizado por um empresário que sabe perfeitamente que tem dois trunfos do seu lado: a qualidade do jogador (e o facto de ter uma qualidade relativa muito grande no plantel dada a má planificação efectuada no defeso em relação à posição de lateral-direito) e o contexto de guerra total entre Benfica e Porto.
Nesta alternativa, o Benfica baixa as calças sem tentar dar muito nas vistas, paga o que Paco Casal (acho que é este o nome do artista) quer, quando ele quer e como ele quer, faz assinar uma cláusula de confidencialidade e, no fim, diz nos jornais que ganhou para tentar uma formar uma opinião pública favorável.

Na segunda alternativa, o Benfica diz, claramente, ao jogador: «Nós não fazemos negócios com esse tipo porque ele nos enganou, deliberadamente, no caso do Cristian Rodriguez, por isso, das duas uma: ou tratamos do negócio da renovação sem ele (e se for preciso arranjamos-te um advogado e assumimos as perdas em caso de perderes o processo) ou não há negócio. E como não confiamos nele, se não houver negócio, tu deixas de fazer parte da equipa e ele que arranje uma solução até ao dia 30 de Janeiro que não seja, nem agora nem no futuro, o Porto. Caso contrário ficas seis meses sem jogar e a treinar à parte porque partimos do princípio que vais jogar pelo Porto para o ano e também deixamos de confiar em ti. Ou estás dentro ou estás fora, mas é para decidir até ao dia 30 de Novembro porque nessa altura começamos a procurar um substituto para comprar em Janeiro.»

O mais certo, nisto tudo, é o jogador querer sair, e faz muito bem. Mas o Benfica faz ainda melhor em fazê-lo sair se ele não «entrar», definitivamente, no espírito da coisa – e o espírito da coisa, actualmente, é uma guerra total com o Porto, em que tem de se entrar para ganhar e não «para ganhar se…»

A questão não está na qualidade do jogador – mesmo que estivesse, atenção, o Maxi Pereira só nos parece tão bom (apesar de ser bom) porque estamos habituados a ele. A questão nunca é se o que sai é bom, é se o que vem é melhor ou pior. E tenho a certeza de que o Benfica consegue arranjar melhor que o Maxi Pereira para lateral-direito. Só brasileiros há às resmas. A questão está no precedente e na mensagem.

O Benfica negoceia, todos os anos, dezenas de jogadores com empresários de todo o mundo. Para se salvaguardar, o Benfica tem de deixar uma mensagem forte aos empresários e aos próprios adeptos: não negociamos com terroristas.
É só isso. Não é fundamentalismo. É política real. Não negociamos com terroristas. Não é para fazer figura de duro: é porque enquanto o Benfica for vulnerável ao terrorismo de mercado vai ser vulnerável aos Danilos, aos Mangalas, aos Falcões, aos Álvaros Pereiras, etc, etc.
Uma posição «de Estado», de exercer o poder, é fundamental nesse caso, precisamente porque o caso é importante.

E é importante que isto fique resolvido até Dezembro. Porque o Porto sabe perfeitamente que tem em Paco Casal um bombista infiltrado no barco inimigo. Se o caso não for resolvido antes disso vai aproveitar a abertura do mercado em Janeiro para tornar Maxi Pereira num elemento de discórdia, de divisão e de desconcentração dentro do próprio Benfica. Ao fim de uma semana já vai haver notícias de que Maxi tem um pré-acordo assinado com o Porto para a próxima época. Mesmo que não seja verdade (e o mais provável é que venha a ser verdade) é o suficiente para minar, por dentro, a estrutura anímica da equipa do Benfica e semear a suspeita da traição.

O Benfica tem muito mais e muito melhor a perder do que muitos Maxi Pereiras se preferir ficar com este Maxi Pereira a custo da sua posição diplomática e negocial futura.

É altura do Benfica começar a assumir uma postura de Estado e de afirmar a sua soberania. A definição de soberania é «um poder sem igual a nível interno e um poder sem superior a nível externo». Mas o poder só existe quando é exercido.

8 comentários:

  1. Hugo,

    Grande crónica, é isso mesmo. Se o Maxi quer alinhar com o empresário, é a decisão dele. O Benfica não pode é ser chantageado. Maxi é grande em termos de atitude, no resto é um jogador mediano.

    Abraço.

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  2. Em relação ao Maxi acho que ele incorpora a tal alma de luta que todos nós sabemos o que é,mas,tal como o Hugo disse,a sua manutenção não implica que seja a todo o custo.Nunca tinha pensado em termos de politica do Benfica,a perspectiva que apresentou e que realmente faz sentido.Aquilo que para mim é óbvio,é que este assunto à muito que devia estar resolvido,incluindo a contratação de um outro lateral direito digo desse nome.Tudo isto leva-me a concluir que infelizmente o LFV não está a ver bem as implicações quer desportivas quer as relações de poder.O que é grave.E as birras internas tornam-se cada vez mais óbvias.O que me assustou no jogo com o Beira Mar,para além do péssimo jogo,foi pressentir que tudo isto está a passar para a equipa.Oxalá esteja enganado.

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  3. Pá, que lufada de ar fresco este teu blog e estas tuas opiniões altamente personalizadas e tão, tão pertinentes. Excelente! Continua. Parabéns.

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  4. João Gonçalves25/10/2011, 10:56:00

    A "questão Maxi" estava longe de me preocupar. Preocupar entre aspas, claro. Há preocupações bem maiores que estas do futebol... No entanto, para mim, parecia que tudo se resolveria facilmente. Quando li aqui o nome Paco Casal e me lembrei do caso "Cebola" comecei a achar a coisa mais complicada.
    Concordo com o que escreveu. Maxi não é nenhum fora de série mas cumpre bem aquele papel e tem uma garra imensa. Se se começar a armar em esquisito a alternativa 2 parece-me a mais correcta. Claro que, em Janeiro, o Benfica teria de procurar outro lateral direito, para além de, se Jesus não contar com Capedevilla, outro lateral esquerdo. De resto não me parece que haja birras internas. O jogo de Aveiro foi apenas um jogo menos conseguido frente a uma equipa que não sendo excelente, defende bem e chateia bastante no meio campo. Felizmente não tinha uma frente atacante de jeito...
    Aguardo mais posts... quem começa a postar assim, depois tem a "obrigação" de "alimentar" o cada vez maior número de leitores. Há que "dar ao teclado"... Força.

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  5. Dou algum desconto ao Vieira por causa da questão do Danilo, que correu mal.

    Penso que, no fundo, ele não estaria à espera que o Porto se chegasse tão à frente por um jogador que terá muito menos importância imediata no Porto do que a que teria no Benfica - aliás, comprar um jogador por aquele preço e deixá-lo a jogar no Brasil diz bem sobre qual foi a prioridade do Porto: não deixar que ele fosse para o Benfica. Continuo a achar que o Porto vai pagar por estes excessos. Acho que está a comprar uma guerra que não vai ter dinheiro para pagar. Aliás, pelo que se ouve do Standard Liége, já não tem...

    Com o Maxi com uma Copa América nas pernas, o Danilo jogaria mesmo muito tempo no Benfica.

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  6. Tão pequeninos que eles são... Dá pena ver um clube que terá sido grande (contam-me) a viver de memórias e ilusões! :)

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