quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Eu vi um sapo...

Ando há uns tempos para escrever um post sobre o que o Jesus fez pelo Benfica e o que já não vai ser capaz de fazer (não é por não querer, é por não ser capaz). Ficava bem nesta onda de encarnadices, mas hoje ainda não dá. Entendam, é que o Jasus é um cromo tão grande que requer atenção especial.
De qualquer forma, estive a ver o Confessionário do post de ontem – espero que não achem Confessionário uma onda demasiado Big Brother, ou de mau gosto, mas é que faz tanto sentido, num blog chamado Religião Nacional, chamar Confessionário ao cantinho dos comentários, que não resisto (fazemos assim, se for má onda, digam-me e façam de conta que eu não escrevi nada disto) – e há lá duas coisas que merecem um Padre Nosso.

Em relação ao Roberto, o Rui tem toda a razão, ele não foi o jogador mais caro na história do Benfica. Mas é que pareceu mesmo! Aqui está a prova de como um mito ganha vida própria. Ouvimos falar tanto de quanto custou aquele barrete que acabamos por criar ideias fictícias.
Bom, como atenuante, ninguém tem dúvidas de que, na relação qualidade-preço, foi o mais caro. Apesar de termos por aí alguns Balboas… É melhor estar calado.

Ficamos assim: se considerarmos que em Portugal ninguém compra guarda-redes estrangeiros a não ser a preço quase zero ou em final de carreira, e chegarmos a um câmbio de 1 para 4 entre guarda-redes e jogadores de campo o Roberto custou para aí uns 35 milhões de euros «reais».
Porque é exactamente isso que sentimos que ele custou.


O Xirico coloca uma questão que eu próprio ando a tentar processar há muito tempo: que história é esta do Benfica com o Fernando Gomes?

Acho que não consigo processar porque não temos nem metade da informação. Não sabemos o que eles sabem.
O que é que podemos dizer que sabemos?

1 – O processo de saída do Porto foi, no timing e nos actos, mais do que suspeita. Recordo que ele sai da SAD do Porto precisamente no momento em que o Porto deixa transparecer, no meio da fúria do caso do túnel, que iria reagir a uma suposta tomada dos órgãos de poder por parte do Benfica.
Com Hermínio Loureiro e a cúpula da Liga alegdamente contra o Porto (ou pelo menos, o que me parece muito mais real, dispostos a perderem-lhe o respeito e a não o tratarem com o estatuto especial que o clube adquirira ao longo de duas décadas), tive a sensação nítida de que o Porto estava a preparar uma revolta, quer no plano técnico (como aconteceu), quer nos bastidores. E teve muito tempo para a preparar, pois no Natal já tinha o ampeonatoqase perdido. Teve tempo para ir roubar o Moutinho, com jeito, ao Sporting, e teve tempo para planear as coisas do lado de fora do campo.

Comecei a ver Vítor Baía a afastar-se sem razões aparentes, outros nomes a aparecerem e, de repente, o número 2 do Porto decide que está cansado, ou que está contra o que se gastou num barrete qualquer (como se já não tivesse compactuado com dezenas de outros barretes iguais), e deixa a SAD para tirar férias.

Coincidência das coincidências, a poucos meses das eleições na Liga.

Outra coincidência: quem é que os clubes da II Liga decidem que é o homem providencial para tomar conta do futebol português? Precisamente o homem providencial que, felizmente, agora estava desempregado.

Já referi neste blog que não acredito em coincidências, não disse?



2 – O Fernando Gomes era mesmo o número 2 do Porto. Não mandava nada no futebol? Talvez não. Mas sabia tudo sobre o dinheiro num clube em que o dinheiro corre a rodos e em que, entre a nascente e a foz, fica branquinho como a roupa na música da Beatriz Costa. No Porto toda a gente mama, desde a Fernanda do Jorge Nuno até ao mais miserável presidente de um Medellín qualquer na Colômbia, passando pelo Araújo da fruta. Tanta falcatrua dá trabalho, e implica ter pelo menos uma pessoa que saiba onde estão os cordelinhos todos, para não haver barraca com a Justiça. Essa pessoa, no Porto, era o Fernando Gomes.

O Fernando Gomes era uma espécie de contabilista do Al Capone. Não sei se sabem, mas o Al Capne, que matou e mandou matar centenas de pessoas, acabou por ser preso por fuga aos impostos, tal era a rede de terror e de influências que criou em seu redor. Se há uma pessoa que pode pôr o Pinto da Costa na prisão é o Fernando Gomes - o homem que se prepara para ser presidente da Federação Portuguesa de Futebol.

É esta pessoa, um indivíduo de extrema confiança de Pinto da Costa, que passou por toda a tarimba interna do Porto, do basquetebol até à alta finança, que, de um momento para o outro, decide que agora ele é que é o presidente da Junta.



3 – Quando Benfica e Sporting se preparavam para lançar um candidato conjunto à presidência da FPF, concretizando uma frente comum que seria, potencialmente, a tomada de posição mais revolucionária do futebol português desde os anos 70 (haveremos de voltar a este ponto noutra oportunidade), quem é que aparece do nevoeiro? O homem providencial, novamente embalado pelos clubes da II Liga.

Reparemos que, neste país, nunca nenhum clube da II Liga se atreveu, sequer, a dar um traque, e agora, de um momento para o outro, assistimos à tomada da Bastilha pelos esfarrapados, finalmente convencidos do seu enorme poder. Que conveniente. Precisamente no momento em que a Federação, graças aos novos estatutos, volta a ser relevante e a deter o poder sobre os árbitros.

Felizmente para os clubes da II Liga que as Associações de Futebol do Porto (agora liderada pelo notável e polivalente Lourenço Pinto, advogado de Pinto da Costa, ex-presidente do CA da FPF e cúmplice de fugas para a Galiza) de Braga e de Coimbra atrasaram o processo de aprovação dos novos estatutos até além de qualquer limite razoável, dando, assim, tempo a Fernando Gomes para confirmar as suas capacidades de liderança invulgares na presidência da Liga, e para fazer o seu tirocínio no dirigismo institucional.



4 - O Benfica não parece apenas interessado na eleição de Fernando Gomes: parece demasiado interessado. Estupidamente interessado. Com uma inocência tão grande que até faz impressão. Já disse aqui mais de uma vez: quando assisto a gafes demasiado óbvias tenho a tendência para pensar que ninguém é assim tão estúpido, e que ali deve haver gato.



Muitas hipóteses se levantam.

Será que Fernando Gomes realmente traiu Pinto da Costa? Que decidiu que ia tomar conta da bola nacional e que Pinto da Costa não se manifesta por ter o rabo preso, por Gomes saber demais?  silêncio do Porto neste processo é claramente estratégico. Tratar-se-á de um recuo ou de um ardil?


Será que Vieira encontrou em Fernando Gomes a vulnerabilidade na blindagem portista, o traidor, o bufo, o contabilista do Al Capone, o homem de quem precisava para começar a minar o poder instalado no sistema?
 

Será que Fernando Gomes é, como sugere o Xirico, um «Junot» de António Oliveira, a verdadeira eminência parda na corrida pelo poder no Futebol Clube do Porto, um homem suficientemente brilhante para pensar a longo prazo e com a lucidez para entender os momentos, as correntes e os epifenómenos deste jogo?
 

Será que as coisas possam ser tão simples como parecem? Que, de facto, tudo é tão básico como um plano de Pinto da Costa para retomar o poder nos órgãos dirigentes do futebol português, e que Fernando Gomes está a conseguir enganar o Benfica – ou a jogar tão bem que lhe rouba qualquer espaço de manobra?
 

João Querido Manha, no Record, há uns tempos, após o anúncio da candidatura (e da futura vitória) de Fernando Gomes, tornava claro que acreditava que tudo isto é apenas a operação final de branqueamento de conduta por parte de Pinto da Costa, uma forma de acabar de apagar, dos livros de história e na opinião pública, a todos os crimes factuais e éticos que o Futebol Clube do Porto e o seu presidente cometeram para atingir o domínio do futebol português. Depois de conquistada a subserviência da imprensa e dos adeptos, muitos deles novos demais para conhecerem a verdadeira perfídia do polvo, depois de conquistados os políticos e as suas instituições, a eleição do todo-poderoso presidente da FPF seria, enfim, a forma de encerrar a completa portização do futebol nacional.
 
Atirar um palpite aqui seria jogar aos dados. Racionalmente, podemos dizer muito pouco. Como já disse uma vez, precisamos de tempo, de concretização, para saber exactamente o que se está a passar neste surreal e meteórico processo de ascensão de Fernando Gomes a dirigente máximo do futebol em Portugal.

Há, para já, pelo menos, uma conclusão que julgo poder tirar: Fernando Gomes saiu do Porto, deliberadamente e em devido tempo, para tomar conta da Liga.
Seguindo um plano do Porto ou um plano particular? Ainda não podemos saber.
Sabendo já do apoio de Sporting e, sobretudo, Benfica? Também não podemos saber, mas duvido muito.
 

O que me diz a tripa (que palavra tão apropriada)? Diz-me que, se eu fosse presidente do Benfica, não engolia.
Mas eu não daria um grande político. Tenho pouco daquela capacidade de engolir sapos para depois cuspir tubarões. Os meandros desta história macabra devem ser tão sinuosos que só mesmo o Vieira e os seus conselheiros estratégicos têm os dados todos na mão.
 

Os mais velhos, como eu (não sou muito velho mas tenho idade suficiente para conhecer a peça há trinta anos), sabem que há uma verdade incontornável em Portugal: não se pode confiar em Pinto da Costa. Nunca. Da mesma forma que, na fábula, o sapo não devia ter confiado no escorpião. Mesmo matando-os a ambos, a meio do rio o escorpião vai ferrar o sapo. É a natureza do animal.


Continuo a ter a sensação forte de que estamos a assistir a uma encenação entre dois cínicos a tentarem ser um mais esperto do que o outro, a ver quem é que consegue enganar quem, quem é que consegue levar o bluff mais longe – o Porto a fingir que não apoia, quando é óbvio que apoia (e tendo o cuidado de não desapoiar, o que seria o mais normal em caso de traição, porque a traição, no Porto é vingada com um furor siciliano); o Benfica a fingir que apoia, quando só está à espera da melhor oportunidade para puxar o tapete e jogar qualquer eventual trunfo que tenha na manga, ou então para apresentar a factura.


Pela corrente histórica, e sem conhecer todos os factos, eu diria que o provável vencedor desta guerra será o Benfica. Em termos de linearidade, é a sua vez de subir e a vez do Porto descer. Mas isto é apenas teórico. Na prática,  a teoria pode ser outra.
(Notemos aqui, como curiosidade, uma nova secundarização do Sporting, que parece pagar o preço de ter uma equipa directiva com falta de tempo de jogo, de ter passado demasiado tempo a ver os outros em guerra. Agora que é preciso puxar do fuzil não se lembra muito bem de como o usar.)

De que tudo isto é uma grande de uma filhadaputice, no entanto, não tenho a mínima dúvida.

3 comentários:

  1. Hugo,

    Não há a mínima dúvida que o Roberto foi o mais caro jogador do Benfica na relação qualidade / preço. Reposta a verdade histórica, avancemos :).

    Apesar de compreender a analogia com o Al Capone, receio que definir Fernando Gomes como o contabilista não faça justiça ao verdadeiro papel do homem. Fernando Gomes foi (é?) um intímo de Pinto da Costa, braço direito (como referiste), representante do Porto em altas instâncias e com passado, curiosamente, em direcções de Ligas Profissionais - presidiu à Liga de Clubes de Basquetebol entre 1995 e 1996, ao que consta numa direcção apreciada pelos demais parceiros. Curiosamente, desde que Fernando Gomes iniciou a presidência da Liga de Basquetebol, o Benfica nunca mais "cheirou" título algum, a não ser há 2 anos, quando ganhou o 1º campeonato desde 1995!

    Se tivesse de recorrer a figuras histórias, talvez preferisse o regime nazi, e divido-me entre ver o Fernando Gomes como o Martin Bormann, chefe da Chancelaria do Reich e um dos mais intímos de Hitler, ou vê-lo como o Albert Speer, alguém que subiu na hierarquia nazi por méritos técnicos, até ser ministro do armamento e da produção de guerra e um dos do círculo de Hitler, até mesmo quando o regime estava a desabar. Albert Speer é um personagem curioso, porque o seu conhecimento sobre os detalhes do Holocausto foi sempre objecto de dúvida. Por outro lado, foi mesmo apontado como o nazi que pediu desculpa.

    Pedindo desculpa por algum "exagero" na comparação, a questão mesmo é se Fernando Gomes é um Bormann (pior hipótese) ou um Speer. Sobre o "nazismo", não tenho qualquer dúvida e os puros são puros "till the very end".

    O episódio da saída de Fernando Gomes da SAD portista é uma encenação do mais rasca possível, com aquele episódio inanerrável do velho corruptor a dizer que não apoiava o, até então, seu delfim, na sua pretensão de ser presidente da LPFP. Não há qualquer hipótese, na minha opinião, da coisa ser genuína. Associe-se isso ao movimento de fundo dos clubes da IIª Liga, e tudo se conjuga para que se trate de algo que podia ter sido parte de uma operação de desinformação dirigida por um qualquer Goebbels!

    È muito por isso, e por admitir que, no limite, Fernando Gomes é o Albert Speer do Fuhrer da Torre das Antas, que me custa a perceber o apoio do Benfica. No entanto, como dizes, pode haver informação só acessível a alguns, que indique que estou redondamente enganado. Espero estar, porque o Benfica precisou de 14 anos para voltar a ganhar, desde que Fernando Gomes passou pela presidência da Liga do basquete.

    Abraço

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  2. Que LFV e o Godinho foram apanhados de surpresa,ai isso foram,e a estratégia do FGomes e PCosta(aqui o Oliveira está incluído)foi brilhante.Baralharam o Godinho e o LFV,com o lançamento de FSFranco,que ficaram praticamente sem reacção.Ora foi quando o FGomes avançou e aí retiraram toda a margem de manobra tanto a um como a outro.Se as coisas são tão simples e básicas como parecem?Não sei mas que a percepção é esta para o comum benfiquista,disso não tenho a menor dúvida,porque tal como dizes tudo cheira a uma grande filhadaputice.O facto de FGomes ter no seu programa,que os direitos televisivos devem ser negociados em conjunto e que devem abranger o conjunto dos clubes,dá folga ao Oliveira para levar a água ao seu moinho.Grande parte do poder do Porto assenta hoje numa estratégia com o Oliveira.Se ele começar a perder poder económico e influência o poder do Porto vai-se diluindo.Estou interessado em perceber como LFV e os seus estrategos vão lidar com todo este enredo.Também têm os seus trunfos.E um desses trunfos são os direitos televisivos.Os próximos tempos vão ser bem interessantes.

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  3. Está na altura de Benfica e Sporting começarem a dominar economicamente o futebol português. A questão é tão simples como isto. Na época industrial do futebol, que começou no ano-Bosman, quem manda é a economia. Se Benfica e Sporting se unirem e começarem a isolar economicamente o Porto dos seus pontos de apoio regionais e, por via disso, institucionais, este sistema está condenado.

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