segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Máquina, Momento, Aleatoriedade

Agora que já todos chegámos à conclusão de que o principal adversário do Sporting no campeonato é o Braga, querlo dizer que não vejo, no plantel do Porto, e em relação ao do Benfica, uma superioridade suficiente para ser um factor relevante na decisão do campeonato. Acho que há três factores, de facto, que vão ser decisivos:
- a Máquina;

- o Momento;

- a Aleatoriedade (porque, se lhe chamasse sorte, pareceria conversa da treta. Desta forma, apesar de a palavra significar exactamente a mesma coisa, dá um ar mais científico…).



A Máquina

O mais notável no Porto é que é uma verdadeira máquina de competição. No Porto tudo está pensado de forma a competir. Essa é a verdadeira força do Porto, e tudo o resto gravita em redor disso – a forma de jogar, a forma de escolher jogadores, a forma de tentar controlar resultados, tudo é abordado de uma forma pragmática: «Isto serve para ganhar?»

A propósito da corrupção, de que o Pinto da Costa falou este fim-de-semana – dando início ao verdadeiro campeonato – devo dizer que não gosto que o Benfica seja campeão graças à corrupção de árbitros, mas que não me importo, realmente, que o Benfica ganhe o campeonato ao Porto graças à corrupção de árbitros. É uma questão de saber jogar com as regras do jogo. O mesmo homem que vem dizer que Duarte Gomes é corrupto é o maior corrupto na história do futebol português, e nada e ninguém o impedem de continuar a ser presidente do clube campeão nacional. Como tal, as regras do jogo estão delineadas. Se é com essas regras que as pessoas querem viver, da minha parte, só há uma alternativa: ganhar dentro dessas regras. Não se está a falar de pudores, de ética, do que devia ser, do que era bonito se fosse – está a falar-se do que é. Obviamente, ninguém se importa realmente que se corrompa resultados desportivos em Portugal. Sendo assim, bola para a frente. O Benfica já percebeu, o Sporting está a perceber, e isso evita que só haja uma equipa em campo para ganhar e as outras para bater palmas. Se a chave para ganhar é corromper árbitros, que se corrompa muito, que se corrompa bem e que se corrompa em força. Quando os corruptos tiverem perdido o suficiente para decidirem que tem de deixar de haver corrupção, então arranja-se qualquer coisa. Mas negociando a partir do lugar de cima. Ou então quando já estiver tudo queimado, incluindo os lugares para nos sentarmos. Também serve. As restrições éticas para se ganhar ao Porto, na minha opinião, são zero. Ao Porto. Não me importo nada que o Porto seja roubado vinte vezes em vinte jogos. A corrupção é como o doping (aliás, o doping é corrupção): ou há moral ou comem todos. Se já fui suficientemente claro, sigamos em frente.

A máquina do Porto está em plena carburação. O papa saiu à rua depois de um não-erro irrelevante, e isso é um sinal. A capacidade de criar factos políticos é um dos domínios da propaganda portista, e condiciona tanto ou mais os resultados como a eventual corrupção dos árbitros. Muitas vezes os árbitros erram mais por estarem mentalmente condicionados que por terem algum interesse particular no erro.

Ao pé da máquina portista, que tem uma tarimba de três décadas, a congénere benfiquista passa sempre uma ideia de menoridade, quer em volume de trabalho quer em qualidade. Não demonstra tanta solidez. Dá a ideia de que depende muito de uma ou duas pessoas, talvez porque o presidente é obrigado a falar demais para passar a mensagem – há o Gabriel, de vem em quando aparece o Rui Costa, qualquer tótó na SIC ou na TVI facilmente inflecte ou desvirtua a mensagem, e enfraquece o objectivo inicial. No Porto, por exemplo, a construção do discurso parece mais metódica – há todo um processo de construção da mensagem pelos agentes de base (os próprios jornalistas, devidamente industriados pela estrutura) e o papa só aparece quando é preciso, para rematar ou, quando se justifica, para despoletar. Há um processo funcional, metódico e de resultados experimentados e comprovados.

Ao nível da gestão do mercado, a mesma coisa.

Janeiro será importante para se perceber se o Benfica, na parte de dentro, conseguiu realmente equilibrar as coisas, se conseguiu evoluir, ou se está vulnerável. Não é que o Benfica esteja frágil, porque não está – tem uma linha condutora, tem relativa uniformidade de discurso, o poder está bem definido e bem orientado – mas quando se vai para a guerra nunca é apenas a nossa força que conta, é sobretudo o que vale a nossa força comparada com a força do outro. Porque, por mais fortes que sejamos, se o outro for mais fortes acabamos igualmente mortos.

Na questão do mercado o Porto parece vulnerável. Está com evidentes problemas financeiros, e aí a máquina está condicionada, mas nem por isso vai facilitar, Já toda a gente percebeu o que está em jogo. Como escrevi ontem, este campeonato é o único verdadeiro braço-de-ferro entre Porto e Benfica nos últimos quase vinte anos. Porto e o Benfica só não vão gastar o que não conseguirem inventar, e no fim da época, ou daqui a dois ou três anos, logo se verá o que para pagar.

O mercado de Inverno não é uma boa solução, por natureza, geralmente melhora pouco – mas esse pouco, neste caso, pode ser o suficiente. Vejo o Benfica com pelo menos três jogadores novos em Janeiro, e o Porto com dois (um ponta de lança é certo, dois é possível) além de Danilo. Quando e como os vão pagar não sei. Nem eles.



O Momento

Para o Benfica, o cenário está criado mas o momento já não está montado. O que se vai ver, logo no dia 27 de Dezembro (aquela altura do ano em que que os nossos machos latinos vão a casa e ficam com tantas, mas com tantas saudades da comida da mamã que pensam duas vezes antes de voltar), é se os jogadores do Benfica vêm de férias ou se vêm de férias. Porque uma coisa é vir de férias, outra coisa é vir trabalhar. Quando o trabalho que nos espera é uma luta titânica, de dimensões históricas, que ou acaba em glória ou acaba em tragédia, é relativamente importante vir com a mentalidade certa quando o avião aterra em Lisboa.

Para o Porto, que começou mais tarde, que andou a dar as baldas próprias da ressaca e que entrou para esta temporada sob a influência da novidade e da refocagem (o Porto sabe, hoje, que aquilo por que está a competir não é o mesmo que era em Agosto, e que o local onde está também não é o mesmo que era nessa altura) Janeiro marca mais um início da época que um reinício.

Para o Benfica, que começou a época mais cedo, na merda, e que teve de lutar arduamente apenas para voltar a um ponto competitivo de base que lhe permite, agora, começar realmente a competir, em Janeiro é mais uma segunda época, dentro da época, a que se inicia. É como ter férias depois de alcançar um objectivo e começar do princípio, enquanto o Porto ainda não alcançou objectivo nenhum e vai começar agora. Neste intervalo, o momento que a equipa criou pode sofrer dois caminhos: ou cai, e desaparece lentamente; ou cresce, e se torna vencedor. Parado não fica. O futebol é dinâmico, sempre. Não há imobilidade. Ou se está a descer ou se está a subir. O que permite subentender que o que o Benfica fez até agora não é suficiente para ser campeão.

Tenho poucas dúvidas em considerar o jogo com a União de Leiria um dos três mais importantes do Benfica neste segundo campeonato, e não dou absolutamente nada por seguro que o Benfica vá ganhar à Marinha Grande.



A Aleatoriedade

Quando falo em aleatoriedade, mais do que no pontapé que vai ao poste, falo dos factores externos à equipa e inerentes ao próprio jogo, e não me refiro a arbitragens.

Refiro-me, por exemplo, a lesões. Vamos imaginar que o Hulk se lesiona. O Porto não ficaria afastado do campeonato, porque as coisas não funcionam assim, mas seria a mesma coisa ter ou não ter o Hulk?

Refiro-me aos adversários. O facto de um adversário chegar em forma ou fora de forma ao jogo não depende de Benfica ou Porto, mas pode, coincidindo com um momento mais fraco de um deles, ditar um resultado mais ou menos propício.

Refiro-me a oscilações de forma. Imaginemos que Saviola (só para dar o exemplo que eu quero mesmo, mesmo muito que aconteça, uma vez que preferia ser campeão contra o Hulk do que sem o Hulk, para calar muita arara que para aí anda…) deixa, de um momento para o outro, de passar a bola um metro atrás e começa a acertar, quer no companheiro quer na baliza. Ou que o James, contra todas as tentativas de massificação do Grande Timoneiro, vê cair sobre si a luz, sem trabalhar nem mais nem menos do que antes, e dá o salto que ameaçou dar no princípio da época e que foi tolhido a meio pelo brilhantismo táctico-administrativo do seu treinador? Estaríamos, aqui, a falar de uma subida qualitativa de qualquer uma das equipas que desequilibraria a luta para um dos lados.

Refiro-me ao sorteio e à conjugação de jogos. Tenho poucas dúvidas de que o apuramento do Porto, na Liga Europa, frente ao City, condicionaria fortemente a sua prestação na recta final do campeonato. E quanto ao Benfica, se eliminar o Zenit e lhe sair, nos quartos-de-final, por exemplo, um Nápoles, um Lyon, um Leverkussen (uma hipótese em 5 mil, bem sei, mas ainda assim uma hipótese), já para não falar de um APOEL de Nicósia, que alternativa teria senão, a partir desse momento, encarar uma presença nas meias-finais da Champions League, algo que nunca conseguiu, como um objectivo tão importante como ser campeão? E se o Porto, nessa altura, tiver só o campeonato para disputar? Decisivo, certamente.

10 comentários:

  1. Concordo com muito do que está escrito. Mas em relação ao pragmatismo não estou totalmente de acordo. Eu sou um acérrimo defensor do pragmatismo, mas como um meio, nunca como um fim. Senão, os ladrões e os terroristas, e a Máfia, seriam o exemplo mais acabado de pragmatismo.

    A ideia do LFV, com a qual eu concordo, é que o Benfica tem de se tornar tão forte quanto possível, até começar a ganhar ao Porto, APESAR de todos os casos de corrupção que são mais do que evidentes. E não sabemos nem metade daquilo que se passa, actualmente, nos bastidores.

    Concorrer com competidores que fazem batota, que usam cartas viciadas, implica um aumento das nossas capacidades para além do que é razoável, e por vezes possível. Mas não é impossível. Se o Benfica conseguir começar a ganhar apesar desta batota toda, sairá desta guerra muito mais forte, irá criar raízes tão fortes que lhe assegurarão o futuro, destroçando por completo o adversário, todos os corruptos que gravitam à sua volta e todas as manhas e os tráficos de influência por si utilizados, remetendo-os a todos para o lixo da história.

    Porque, no fim, "os vencedores têm sempre razão".

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  2. Manuel:tudo isso é muito bonito mas relembro-te aqui que o conselho de arbitragem ficou dividido:o Victor Pereira nomeia os árbitros mas as classificações deles ficaram na mão do Paulo "Contumil" e é assim que se compreende a vinda à liça do corruptor mor a relembrar todos de isso.Portanto o Benfica não se pode esquecer disso a não ser que queira continuar a ser gamado nas barbas.Há que exercer o poder contra tudo e contra todos principalmente tem que vincar a sua influência doa a quem doer,e que espero seja contra o Porko e os Lacostes.O Hugo tem toda a razão:ponham-se em bicos de pés com a treta do fair play e depois digam que não vale que vos vai servir de muito.HÁ QUE DEITAR ABAIXO e com as mesmas armas.

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  3. Eu entendo o que dizes, Manuel. Mete-me nojo a corrupção. É uma espécie de venda da alma. Mas não há três opções: ou jogamos ou não jogamos. Se jogamos, só há uma coisa que interessa: quais são as regras?
    Não vivemos numa bolha, nem no éden - vivemos no mundo que fazemos, mas sobretudo no mundo em que nos fazem viver.

    O ideal seria, de facto, ser superior a isso. Se é possível? Não quero acreditar que não é. Mas, como diz o Xirico, olha para os sinais, em pleno pós-Apito.
    A partir daí, só conheço uma regra: eles entram à canela nós entramos ao joelho. Afinal, somos mais fortes que eles. Onde é que isso vai dar? A um sítio mau, certamente. Ao sítio onde nos levam. Mas qual é a alternativa? Perder e entregar-lhes a História para eles a darem a rescrever aos seus vassalos, como tem acontecido?
    Cheguemos a esse sítio mau à frente, e aí sim, teremos uma oportunidade real de demonstrar se somos ou não superiores.

    Eu gostava de ter o futebol inglês na Luz, nas Antas, em Alvalade, em Braga, em Guimarães... Mas tenho o português.

    Abraço

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  4. Tens razão, Hugo, eu também gostava de ter o futebol inglês, ou alemão, em Portugal. E a mentalidade nórdica.

    Mas não podemos nem devemos desesperar. A verdade é que os bons ganham sempre no fim. Não conheço nenhum caso em que o contrário tenha acontecido, nem nos filmes de Hollywood. :-))

    Este ano o Porto quis concorrer com o Benfica no aliciamento e na contratação de jogadores e ficou claramente a perder. Dai todos estes problemas que eles têm e que vai levar tempo a resolver. E porquê? Porque o Benfica, os dirigentes, aprenderam com os erros passados. Penso que se continuarmos a ser mais competentes do que eles, como fomos agora, o futuro será nosso.

    Repara que os 3 melhores jogadores que eles contrataram até agora, Alvaro Pereira, James e Falcão, fizeram-no depois do Benfica mostrar interesse. Este ano o Benfica estava interessado no Danilo, mas eles tiveram de empenhar o cú e os calções, pagando quase 4M€ de custos de intermediação, para nos ganharem a corrida. E se pensarmos que para o vender vão ter de dar mais 3 ou 4 M€ de comissões, então para obterem lucro terão de o vender por bem mais de 20M€.

    Quiseram o Witsel, o Bruno, o Eduardo e o Nolito e não o conseguiram. Por isso, estamos a aprender e depressa. E com a fama de caloteiros que ganharam este ano, mais difícil será.

    Vamos com calma e com fé.

    Mas estou de acordo que não nos podemos nem nos devemos calar sempre que os nossos interesses forem atropelados por jogos de bastidores e pela batota. Agitar e protestar é preciso. "Quem não chora, não mama", é o lema dos sportinguistas. LOL. E têm ganho alguma coisa com isso.

    Aliás esse tem sido sempre o lema do Corrupto-Mor, por isso veio a terreiro queixar-se da arbitragem, depois de ter ganho, mas com o intuito de semear agora para colher mais tarde.

    Abraço e Bom Natal a todos os benfiquistas de boa vontade.

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  5. O SAKANA está de volta com o JERBICHA na berlinda....ihihihihi.....

    www.sakanagem69.blogspot.com

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  6. Boa tarde a todos.

    Mais uma vez revejo-me nas minha opiniões expressas neste blog.

    Quero dar os parabéns ao Hugo pela forma pragmática e descomplexada com que aborda a realidade futebolística nacional.

    Tomei conhecimento do blog a partir dos comentários inseridos pelo "especulador precoce" (GENIAL caro Hugo) nos blogs do Record e a partir daí que fiquei fã e tenho acompanhado cada post.

    Relativamente a este último, mais uma vez de acordo. É correcto? É justo? É punível? É, acima de tudo, discutível...

    Votos de um Feliz Natal e de um excelente 2012!

    E já agora, de um Benfica Campeão! :)

    Bezelga

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  7. Acho que o caminho que o Benfica tem seguido tem sido o correto. É evidente, no entanto, que as coisas vão mudar, e o primeiro sinal foi dado pelo espirro de Pinto da Costa sobre Duarte Gomes (um árbitro absolutamente "merdíocre") e por isso o Benfica não pode adormecer. Sendo impossível não concordar com o Manuel, porque isso é que tem de nos distinguir da maralha acéfala que o que quer é ganhar não importando a forma como isso é conseguido, não se pode deixar de concordar com o que diz o Hugo. Tem de ser uma batalha em todas as frentes.

    No resto, a análise tem a excelência habitual.

    Os meus votos de Bom Natal :).

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  8. Após visita 9025 um Bom Natal ao Hugo e todos os companheiros de comentários.

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  9. Finalmente encontrei um blog onde posso de facto discutir futebol sem adeptos cegos ou fanáticos. Obrigado! Força BENFICA!

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  10. Bom, parece que o terreno na Marinha Grande já começou a ser aplainado...

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