terça-feira, 23 de agosto de 2011

Jornada 2

O que parece:

Vitória muito fácil do Porto, facilitada por uma expulsão perdoada que, admitamos, tornaria a vitória mais difícil, mas não impossível. Mesmo sem Otamendi e a perder por 1-0, 88 minutos a jogar em casa – e não obrigatoriamente em superioridade numérica, uma vez que facilmente o árbitro encontraria uma maneira de expulsar também um jogador do Gil (é a regra, sobretudo quando há expulsos nos jogos dos três grandes) – seriam mais do que suficientes para o Porto dar a volta ao resultado. Só em condições muito anormais isso não aconteceria.

O Benfica salvou-se à pele no jogo, provavelmente, mais fácil da época, perante uma equipa extremamente fraca, que só ganhou alguma dificuldade por se situar no meio de uma eliminatória europeia vital. Em termos de resultado, por ter acabado em 3-1 e por ainda ser início de temporada, passa quase em branco, aos olhos dos comentadores e, aparentemente, dos adeptos, a possibilidade real de o Benfica ter perdido o campeonato à segunda jornada, por culpa completamente própria. A verdade é que, numa arrancada irracional, e ao acaso, Maxi Pereira salvou a época do Benfica, assim como o árbitro, que não teve coragem de marcar uma penalidade mais evidente do que a empatou o jogo para o Porto, nas Antas – ainda que menos que a que não foi marcada a favor do Gil Vicente já perto do final da partida.

O Sporting acaba dois jogos perante equipa medíocres sem marcar um golo e com dois empates. Seis dos pontos mais baratos da época ficam reduzidos a dois. Racionalmente, o Sporting enterrou, à segunda jornada, as suas hipóteses de ser campeão. Uma recuperação de quatro pontos para o Porto, ainda sem ter jogado com uma equipa que vá acabar entre as nove primeiras, quando o Porto já foi a Guimarães, implicaria ter de fazer, daqui para a frente, os mesmos resultados que o Porto e, nos confrontos directos, ganhar o jogo em Alvalade e não perder o das Antas. Reafirmo que o arranque de campeonato do Sporting seria fundamental e foi péssimo. A partir deste momento o Sporting passa a jogar para o segundo lugar, esse sim, ao seu alcance. Aliás, não é de desprezar a hipótese de o Sporting, sem pressão excessiva, e colocado perante um desafio a que pode, de facto, responder, faça, daqui para a frente, um campeonato satisfatório.

O que é:

Porto (IRPR = 0,110) – Voltou a dar a melhor resposta dos três à pressão. Poucas horas de ter perdido Falcão (que, na prática, não tinha chegado a começar a época) e sofrendo um golo primeiro, mas muito cedo e com decisões arbitrais favoráveis que ajudaram a libertar pressão, teve o jogo mais fácil da época até agora.

Benfica (IRPR = 0,085) – Toda a pressão que o Benfica sofreu neste jogo foi auto-inflingida, à excepção do Twente metido no subconsciente. Sem lesões, sem adversário, com árbitro, com vantagem rápida, o Benfica teve praticamente tudo a seu favor. O jogo mais fácil do ano, até agora, que a incapacidade do Benfica em gerir o momento tornou o mais difícil.

Sporting (IRPR = 0,051) – A pior prestação da época, até agora, entre os três grandes, no jogo mais fácil, também, para o Sporting, até agora – mais do que o do Olhanense, em que a pressão própria da estreia oficial, no próprio estádio (onde, o ano passado, a equipa se enterrou completamente), e uma arbitragem relativamente desfavorável aumentaram bastante o IRPR potencial (1.20 em 3.00 possíveis contra apenas 0.400 neste). O Sporting suicidou-se por negligência.

O que fica por saber:

Porto:

- Até que ponto faz sentido, existindo um clima de segurança, que Pinto da Costa sinta necessidade de ir ao canal do Porto transmitir uma mensagem de confiança aos adeptos, dizendo-lhes que voltarão a formar uma grande equipa, quando, até agora, e depois de uma troca de treinadores que, segundo ele, foi benéfica, a única coisa que mudou foi a saída de Falcão? Os portistas não deveriam estar completamente seguros da equipa que têm, e de que basta comprarem um bom avançado, e não de que têm de refazer uma equipa? A equipa tem a eficácia normal, mas os índices de confiança no Porto estão nitidamente abalados, com duas das três principais figuras do grupo (Villas-Boas e Falcão) a saírem à má-fila e sem contemplações. Como já disse, a religiosidade que se atingiu a época passada, pura e simplesmente, não está lá. E o treinador não ajuda nada.

- Será sensato ao treinador do Porto escalar tão rapidamente o nível de conflito, extravasando o âmbito do jogo para o nível pessoal (aí Jesus respondeu muito bem, demonstrando muito maior experiência, e no tom certo - «Não ataquei o carácter»), na reacção a apenas uma frase por parte do seu rival? Assim como será sensato tornar tão claro como Vítor Pereira tornou que queria a equipa a render mais que na época passada? Na verdade, no segundo caso, essa é a verdade: o Porto tem de render mais que na época passada se quiser ir longe na Liga dos Campeões e voltar a ser campeão, mas a ideia que Pereira passou é que isso não seria assim tão complicado, quando, na verdade, é. Parece-me que Pereira tem, ao mesmo tempo, maior necessidade de afirmação pessoal, maior dificuldade de conviver com a pressão e muito menor élan mediático que André Villas-Boas. Tem a mesma escola de confiança que Mourinho inaugurou mas não parece ter a mesma inteligência que aquele ou Villas-Boas. Tem as costas quentes e sente que está situado num patamar muito superior ao da concorrência, mas não tem um passado propriamente inequívoco. Já falhou uma subida com o Santa Clara e pouco fez debaixo de pressão.

- o Porto parece nitidamente inquieto, sem razão aparente para isso, e os resultados têm ajudado. O jogo com o Barcelona, de grande pressão, será um verdadeiro teste à fiabilidade desta equipa, e fica a dúvida sobre que efeitos poderia ter, a médio prazo, um resultado muito mau contra o Barcelona, ou uma exibição muito má. Numa equipa que passou um ano praticamente sem ser beliscada, a Supertaça europeia deste ano terá o mesmo papel determinante que a Supertaça portuguesa teve na temporada passada.

Benfica:

- Numa equipa que é e será, na forma de jogar, nos defeitos e nas virtudes, exactamente a mesma que foi no ano passado e no anterior, apenas com o acrescento de cinco jogadores de capacidade real e não apenas hipotética (Nolito, Garay, Emerson, Artur e Witsel, para já), há uma diferença fundamental desta época para a anterior, no Benfica: o factor estrelinha. Em três jogos traiçoeiros de início de época o Benfica salva-se com uma vitória (com o Feirense quando, no ano passado, se calhar teria deixado ficar aí o campeonato – Académica…), um empate que sabe a vitória (depois de ter começado a perder com o Twente aos 10 minutos de jogo fora de casa) e um empate com o Gil que, sendo mau em relação ao desenrolar do jogo, não é, ao contrário das derrotas do ano passado com o Nacional ou o Guimarães de há um ano, definitivo, e que se assemelha em muito ao empate com o marítimo na primeira jornada de 2009/2010. Em três jogos de desfecho potencialmente ingrato o Benfica já teve dois empurrões da sorte. Pode ser só disso que a equipa precisa para balançar, desta vez, para o lado certo. E daí para a frente o desfecho é incerto. Os próximos dois jogos do Benfica assumem-se, assim, como dois dos mais importantes da época. O do Twente, ante uma equipa que pode perfeitamente vencer na Luz e desacreditar definitivamente o treinador. O do Nacional para saber se a sorte, este ano, está mesmo virada ao contrário ou se não chega a para tanto. O jogo da Madeira encerra um factor de relevância suplementar: se o Benfica ganhar passa a estar, pela primeira vez num ano, à frente do Porto, que adiou o jogo de Leiria até 6 de Setembro. Não é desprezível. Vamos estar perante um campeonato mais equilibrado do que o que se pensa neste momento. Estas pequenas nuances psicológicas, sobretudo numa equipa muito volúvel, como é a do Benfica, muito dependente dos pormenores, podem assumir grande importância final.

Sporting:

- Domingos começa a parecer vulnerável apenas porque já se viu que não é nenhum génio, nem nada que se pareça. Em três jogos perfeitamente acessíveis o Sporting não só não ganha nenhum como não marca nenhum golo, e praticamente sem lesões no plantel. Dos reforços só falta jogar Bojinov – o ponta-de-lança em que mais se aposta… - e de resultados, nada. O Sporting conseguirá fazer uma equipa se, mesmo não jogando bem, obtiver resultados. Sem resultados, não há tempo. Domingos poderá resistir a uma eliminação da Liga Europa, mas não resistirá a um avolumar da distância para o Benfica, que é sempre o barómetro real para o Sporting. Neste momento, o Sporting está já atrás do Benfica, e só por isso a pressão aumentou exponencialmente, mesmo muito mais que depois do empate com o Olhanense, um resultado muito pior mas apagado pelo empate do Benfica em Barcelos. A sorte de Domingos, Duque e Freitas, novamente, é o calendário: mesmo com um péssimo arranque, provavelmente a equipa chegará à sexta jornada à frente do Benfica, se este perder nas Antas. O pior é se não perde porque, depois disso, começa o verdadeiro campeonato para o Sporting…

- Algumas opções de Domingos que convém analisar: Yannick e Matías substituídos à meia-hora, um bom sinal de inconformismo e de comando sob o plantel do treinador, com confiança para fazer o impensável (eu, pelo menos, nunca vi tirar dois avançados à meia-hora para tentar ganhar um jogo) sem perder a mão nos jogadores, mas efeitos duvidosos porque a equipa, basicamente, pouco reagiu e perdeu; Rubio sem jogar, quando não acredito que não tivesse marcado um dos golos que VW (vou chamá-lo de Carocha daqui para a frente) não marcou por falta de energia – pelo que vejo, Diego Rubio é o melhor avançado do Sporting, que, entre as políticas, as tácticas, a estratégia e as economias está a ser desaproveitado a bem de qualquer outra coisa que não os resultados imediatos, e isso é péssimo, porque nenhuma grande equipa sucede colocando o futuro à frente do presente; Carriço a entrar porque tinha de ser, depois de nem para o banco ter ido na Dinamarca, um sinal muito mau para ele, como eu já tinha previsto antes do início da época.

- O jogo de Aveiro marcará a época do Sporting, não só porque, como se verá mais à frente, a equipa entregou aí o campeonato, mas também porque, politicamente, o clube saiu muitíssimo fragilizado desta jornada. A rejeição dos árbitros em arbitrarem os jogos do clube apanhou-o de surpresa, e a capacidade de resposta, quer dentro quer fora do campo, foi fraquíssima.

Primeiro, Carlos Freitas e Domingos saíram a atacar Carlos Xistra, de forma clara, depois de Duque ter dito que o clube não se desculparia com os árbitros. Na prática, fê-lo ao primeiro mau resultado, e o resto é conversa.

Depois, o clube usou a imprensa para, veladamente – e não frontalmente, como seria melhor se, de facto, a intenção fosse reequilibrar a balança do poder do clube com a arbitragem e marcar posições – pressionar o árbitro e a Liga para o jogo seguinte. A oportunidade era boa porque João Ferreira, de facto, é um árbitro do Benfica e já prejudicou muito o Sporting, com dolo, e porque a Liga se pôs a jeito ao nomeá-lo depois de uma prestação prejudicial de Xistra. Mas o Sporting jogou mal. Ao utilizar o jornalista Bernardo Ribeiro – subchefe de redacção do Record, um dos aliados mais sólidos de Carlos Freitas, seu antigo colega no Jogo, nos jornais, e elemento, neste momento, muito disponível para fazer do seu jornal o veículo de criação de opinião pública do Sporting – para pressionar, indirectamente, a arbitragem e marcar posição, o Sporting foi tíbio e deu o flanco. Não estava, seguramente, à espera que os árbitros marcassem também eles a sua posição. Fizeram-no, contudo, à custa do Sporting, que, como ficou mostrado, não mete medo. É difícil de imaginar este tipo de situações a ocorrer com Porto ou Benfica. Mas o Sporting é de outro campeonato – um campeonato inferior, onde os árbitros podem jogar taco a taco e sem medos.

Para os árbitros, este jogo foi uma importante tomada de força colectiva. Uma vitória, sem nenhuma dúvida, e provavelmente a maior vitória dos últimos anos – das últimas décadas? – para o futebol português. Digo isto porque só os árbitros podem salvar a arbitragem e, com ela, o futebol de alto nível em Portugal. Ver os árbitros unidos, convictos e com uma agenda própria é um passo fundamental, provavelmente o mais essencial, nesse salvamento. Só fica a faltar a coerência e o seguimento: os árbitros conseguirão, depois disto, fazer o mesmo ao Porto e ao Benfica, e alargar o âmbito do seu protesto, também, para as declarações a seguir aos jogos, e não apenas às pressões anteriores a eles?

Para o Sporting, enorme fragilidade. O clube não só não mete medo como parece ter medo de se fazer ouvir, fala por interposta pessoa e, pior ainda, chega ao ponto de se deixar entalar entre a porta e a incoerência, quando Freitas diz que «o Sporting nunca falou de João Ferreira» e que «não coloca em causa a idoneidade» de Xistra. Sem ter coragem de dizer as palavras, o Sporting fez precisamente isso, e perdeu a face, ainda que teime em continuar a falar. Não só não se mostrou diferente dos outros como se mostrou mais fraco que os outros. Para piorar tudo, os dirigentes não conseguiram transmitir à equipa o significado do jogo, e esta responde com a pior exibição da época, não conseguindo ganhar, nem sequer jogar, mesmo sem árbitro. Qual a moral real do Sporting, depois da exibição de Aveiro, para falar de árbitros? Falar podem, mas quanto mais falarem mais se enterram.

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