terça-feira, 8 de novembro de 2011

Terreno sagrado

Sou um liberal. Acredito no Governo mínimo, acredito na justiça antes de acreditar no Direito e acredito no indivíduo antes de acreditar no Estado. Sou quase um anarca. Isso poder parecer giro, mas, na verdade, se as pessoas soubessem o que isso realmente implica mais depressa me mandariam prender por constituir um risco para a sociedade. Tudo bem.
O facto de dizer que o futebol, em Portugal, é uma religião nacional, é apenas parcialmente eufemístico. Na prática, há mais de religioso no futebol, em Portugal, que na igreja.
Para mim, o futebol só faz sentido se se partir de um pressuposto – e é para se chegar a esse pressuposto que eu, afinal, escrevo este blog: o pressuposto de que o campo de jogo é um lugar sagrado.

Quando digo que é sagrado, evidentemente, não me refiro às acções mais ou menos litúrgicas que se passam lá dentro. Refiro-me a necessidade de ser inviolabilidade, inconspurcável por quem não é do campo, e, também, limitado, ou seja, naquele rectângulo, ninguém entra, mas o que se passa lá dentro também não sai.
Haver bolas de golfe, isqueiros, petardos, invasões, dentro de um campo de futebol é a negação do jogo, da mesma maneira que o é fazer emboscadas a jogadores e a árbitros fora dele, seja em túneis ou em centros comerciais. Nem sequer estou a falar de dignidade, de indignidades, de cobardias, de pulhices – estou a falar do princípio. O campo de batalha é o campo de batalha.

A única forma de conceber o futebol é concebê-lo de forma a que tudo o que ele tem de bom ou de mau se manifeste no interior daquele rectângulo. Eventualmente tentar fazer do espaço uma área mais saudável, mais atraente, tentar fazer o jogo melhor, o melhor possível, mas mesmo isso depende de quem vê o jogo. Há grupos de pessoas que não gostam realmente do jogo mas do conflito que o rodeia. Nesse caso, melhorar o que se passa no «campo de jogo» não é importante. Não estou a fazer juízos de valor. Estou só a dizer que o campo é o campo.

No sábado disse que, se fosse dirigente do Benfica, fazia do erro do Proença o sim ou sopas do futebol português. Não volto atrás no que disse. Só altero uma coisa: não fazia, tentava fazer. Porque não acredito, realmente, na importância dos dirigentes enquanto agentes determinantes do futebol.

Os dirigentes são agentes superficiais ao jogo, tal como os adeptos. Antes de haver adeptos e dirigentes já havia jogo. Foram eles que se aproximaram do jogo, não o contrário. Os próprios treinadores são elementos parcialmente secundários, que só lá chegaram numa segunda vaga, e mais a pedido dos jogadores que propriamente por terem algum talento especial. Chegaram á conclusão que havia uma vantagem em ter alguém a ver o jogo de fora e inventou-se o treinador. E os árbitros a mesma coisa. Era preciso um elemento imparcial para decidir dúvidas justas e deu-se um apito a alguém para que todos o ouvissem. Convém não esquecer estes pormenores.

Quem faz parte, realmente, do jogo são os jogadores.

Quem tem de defender o jogo é quem o joga, não é quem o paga nem é quem pensa que manda nele. Quem joga tem de tratar do jogo. Se ele for bom, pagamos para o ver. Se ele for grande, arranja-se quem marque os campos, os hotéis, quem pague a viagens, os salários, etc, etc.

Quem tem de defender o jogo de futebol é, em primeiro caso, o jogador. No sentido plural. Há o ligeiro problema de o jogador de futebol ser, regra geral, demasiado ignorante e pouco habituado a exercer qualquer tipo de poder. São pessoas do povo, convencidas de que lhes fazem um favor por lhes pagarem para jogar futebol. Não percebem o poder que têm e por isso também não o exercem.

Quem tem de defender o jogo e, também, o treinador. Não é por causa do dinheiro, ou do fair-play, ou de coisa nenhuma em particular. É porque é. Não é a UEFA que tem de reunir os melhores treinadores para eles discutirem o jogo – devem ser os treinadores a reunirem-se, a discutirem sobre o jogo e a dizerem à UEFA: «Olhem, o jogo agora vai será assim. Façam isto, e isto, e isto, senão arranjamos outros.»

Quem tem de defender as leis do jogo e os árbitros não são as APAFes, nem as Ligas, nem os CAs, nem os CDs, nem as PSPs – são os árbitros. São os árbitros que devem dizer aos jogadores quais são os problemas e resolvê-los.

Sou radical, neste aspecto. O mal do jogo não é o facto de ser profano em redor do campo d e jogo, é o facto de se profanar o campo de jogo. O que se passa no campo deve ser resolvido dentro do campo. Seja como for. É conversa? É conversa. É trolha? Seja trolha. Eles são brancos, e pretos, e amarelos, que se entendam. Eles que decidam quem é racista, quem é porco, quem é sujo, quem deve ou não deve jogar. Não é num jogo em particular, obviamente, mas é de maneira a que eles próprios, os donos do jogo, se entendam fora de campo para resolverem os problemas dentro dele.

Vamos admitir que o Javi chamou preto não sei do quê ao Alan e aos filhos do Alan e à mãe do Alan e ao cão do Alan. Nem sequer quero entrar no terreno do juízo valorativo, do que é o insulto, do contexto do insulto, do propósito e da intenção do insulto. Também não quero entrar no terreno da justiça do insulto – de quem é o Alan, do que ele fez, faz e continua a tentar fazer, sempre, em todos os jogos, e do que ele representa.

O que eu quero é dizer que o que se passa dentro de campo resolve-se dentro de campo. Se isso implica o Alan dar uma tareia o Javi, e acabar tudo à porrada, ou apenas fazer  queixa ao árbitro, ou sair de campo, como fez o Roberto Carlos, ou tentar partir a perna ao javi, como ele tentou, seja lá o que for, que seja. Mas fica dentro do campo. Mesmo que não seja naquele campo. Mesmo que seja na Luz, daqui a uns meses. Ou noutro campo qualquer, em que o Alan peça a um amigo para arruinar a carreira do Javi. Tudo isso é secundário. O que importa é que fique DENTRO do campo. Até aquela cotovelada do Paulinho Santos ao João Pinto, há uns anos – aquilo tinha de ser resolvido dentro do campo, naquele dia, na semana seguinte, no ano seguinte ou no torneio de veteranos do INATEL. Não interessa.

Porque, quando tira o que é do campo de dentro do campo, o que o Alan está a fazer, mais do que uma canalhice, mais do que tentar fazer política e jogo sujo (que está), é a destruir a sacralidade do terreno de jogo. É a destruir a única coisa que torna o jogo um jogo, e não apenas mais um processo de autodestruição entre os homens.

P.S. - Em relação aos comunicados, não se preocupem muito: é só a luta natural de um clube a tentar existir

5 comentários:

  1. A mim chateia-me à brava é que a Direcção do Benfica não tenha ainda assumido a defesa pública do Javi...

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  2. Mas que é isto?A Direcção não diz nada?Já passaram 3 dias o LFV não diz nada sobre tamanha campanha que movem contra os nossos jogadores?Que rabos de palha tem o nosso Presidente em relação ao sr.Salvador?Já o ano passado após ataques incríveis contra os nossos jogadores(o Carlos Martins levou com um isqueiro na cabeça,fora as bolas de golfe e ataques a aficionados)o LFV vem dizer que o Benfica e Braga são muito amigos e que são óptimas as relações entre os clubes.Mas ele pensa que eu sou parvo?

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  3. Existe uma política muito clara por parte do SPBraga para acabar com os benfiquistas, e a simpatia dos habitantes para com o Benfica, em Braga. Essa estratégia tem por cúmplices os políticos e a própria polícia. E também a indigência da população que, como os carneiros, se deixa manobrar e instrumentalizar.

    Por isso, enviam os jogadores do Braga às escolas e quando o fazem nem sequer aceitam que os miúdos tenham vestidas camisolas do Benfica. Esses miúdos são obrigados a sair da sala, envergonhando-os perante os outros colegas. Totalmente inadmissível, pois parecem as limpezas éticas de que se houve falar nos antigos países da Jugoslávia, guardadas que são as devidas distâncias. Se isto não é uma forma de racismo ou de discriminação e xenofobismo, não sei...

    Os benfiquistas não se podem manifestar publicamente em Braga a sua simpatia clubística, pois são logo atacados. Isto é, a liberdade de expressão e de manifestação, direitos básicos em democracia, estão proibidos, como se Braga estivesse sob uma ditadura.

    O presidente do Benfica não pode fazer nada sobre isto. O que querem que faça, que congregue um exército e ataque a cidade de Braga? Se falar muito ainda lhe pedem para provar o que diz e será objecto de escárnio por parte da CS e dos adeptos de outros clubes e de estar a levantar falsos testemunhos e acusações falsas e de estar a incendiar o futebol português.

    Meus amigos, a única coisa que ajuda é denunciar todos estes atropelos às leis e aos direitos de cidadania em tudo o que é sítio. Quem tiver gente amiga ou família na zona de Braga que tente saber o mais possível sobre o que se passa e o denuncie. Atacar a direcção ou elementos do Benfica por algo de que não têm a culpa é desviar as atenções da realidade e dar autênticos tiros nos pés.

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  4. Caro Manuel,

    Não veja a minha posição como um ataque à direcção do Benfica mas apenas como uma crítica. Não sou dos que acho que a direcção tem responsabilidade sobre tudo e mais alguma coisa, desde o penalti do Proença até à água fria nos balneários.
    No entanto, no caso do Javi parecia-me imperativa uma posição pública. O jogador não pode sentir-se sozinho perante um ataque premeditado de tal gente. O presidente disse qualquer coisa, o que não foi mau, mas justificava-se mais e até se justifica um esfriamento nas "excelentes" relações com o Braga. Salvador é o responsável por um clima inaceitável num país da Europa ocidental e o Benfica não pode ficar impávido face os relatos que tantos benfiquistas fazem do que se passa em Braga e a outras notícias que surgem na imprensa.

    Cumprimentos.

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  5. Rui, quem fez o comunicado do Javi foi a Direcção de Comunicação do Benfica. Essa já foi a posição pública. O Benfica está infelizmente de pés a mãos atadas e não pode fazer muito mais do que isto. Se começar a disparar em todas as direcção é mau para o clube pois não pode provar as acusações. E cai no ridículo, com as consequências de imagem graves que daí possam advir. Esta é a minha posição. O Benfica tem de dar-se ao respeito. Mas não é disparatando que o faz.
    Quanto muito o que o Benfica podia fazer era promover uma abertura de um inquérito por parte do Javi e desafiar o Alan a provar as acusações.
    Por outro lado, "O desprezo é o maior insulto".

    Saudações Benfiquistas

    PS. Os benfiquistas têm de se unir e serem eles a promover as denúncias das poucas vergonhas que acontecem por lá. No fim de contas não são os benfiquistas que dizem que o Benfica são os adeptos? Foi John F Kennedy que disse um dia, "Não perguntem o que a pátria pode fazer por ti, pergunta antes o que tu podes fazer pela pátria". Pois façamos nós, adeptos, algo pelo Benfica. For a change.

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