domingo, 3 de fevereiro de 2013

«Tu não és mauzinho...»


Hoje ainda não me apetece falar de coisas sérias. Ando em desmame do stress dos exames e desde a semana passada que praticamente só falo aqui de corrupção, corruptos e fruta fora de época. Apetece-me disparatar um bocado.

Em Aveiro aconteceu um daqueles fenómenos inexplicáveis em que o futebol é fértil: o Braga, a jogar com o Paulo Vinicius e com onze jogadores nos últimos dez minutos – por via de nenhum dos seus centrais ter sido escandalosamente expulso depois de um avançado do Beira-Mar ter tropeçado na sua própria perna de propósito quando ia sozinho para a baliza –, o Braga, dizia, levou três golos do Beira-Mar.

Como dizia o Gabriel Alves, o futebol é isto. Imprevisível.

Em Vila do Conde, o Sporting do Joãozinho fez o seu segundo melhor jogo «da era Jesualdo Ferreira» e acabou com o mesmo resultado que teria acabado o «melhor jogo da era Jesualdo Ferreira», uma semana antes, frente ao Vitória de Guimarães, se o Xistra (sempre tão caseiro…) não tivesse fanado ao Vitória um penálti do tamanho do Marquês de Pombal no último minuto.

Deve notar-se, aqui, duas coisas.

Primeiro, que a boa vontade com que esse lance foi tratado e rapidamente esquecido nos leva a crer que, de facto, o caso do Sporting é, actualmente, de solidariedade nacional, semelhante ao das avalanches da Madeira ou do temporal de há quinze dias. Vamos ver se, daqui por mais ou menos um mês, quando o Porto vier jogar a Alvalade se mantém o espírito de salvação do Sporting ou se, em sinal de gratidão, se abrirão avenidas de boa vontade para Izmailov, Liedson, Moutinho, Varela e companhia aí passarem com facilidade uma etapa potencialmente decisiva para o título.

Há muitas maneiras de ser enganado, mas ser enganado sucessivamente pelo Porto como o Sporting é enganado e reagir como o Sporting reage faz-me lembrar aquela anedota do caçador e do urso.

Resumidamente, o caçador anda a tentar caçar um urso. O urso apanha-o sempre, baixa-lhe as calças, diz-lhe «tu és mauzinho», e arromba-o todo.

A certa altura, o caçador volta a insistir, o urso volta a apanhá-lo e chega a uma conclusão óbvia: «Tu não és mauzinho, gostas é de levar no rabinho.»

Do jogo de Vila do Conde ficou-me a confirmação de que o miúdo Oblak tem um instinto para a baliza que raramente vi num guarda-redes de 20 anos e que o outro miúdo Diego Lopes tem atrevimento e futebol nos pés suficientes para, no Benfica ou noutro Benfica qualquer, ser um jogador a sério.

A talho de foice, li, em qualquer lado, um comentário indignado de um sportinguista a dizer que o Adrien devia ter sido convocado para a selecção em vez do André Gomes. Quando acabei de tossir, limitei-me a concluir que, com 19 anos, o André Gomes tem mais futebol no pé direito do que o que o Adrien vai ter no corpo inteiro quando tiver 30. E o Adrien até é bom jogador.

Hoje também percebi, finalmente, a lógica do número 89 do André Gomes. 8, 9…10, quando o Aimar se reformar. É a progressão natural.

Devo dizer que não fiquei minimamente preocupado com a «ausência» do Benfica no mercado de Janeiro. O jogador de que o Benfica precisa não se compra em Janeiro, em saldos. Compra-se com tempo, no verão, tal como foram comprados o Javi Garcia, o Witsel, o Garay, o Ola John, o Matic, e praticamente todos os que fazem a diferença. Os que vêm em Janeiro, regra geral, só vêm fazer despesa. Também não acho que vá ser por falta de um médio-centro que o Benfica não vá ser campeão, que deixe de ganhar a Taça ou que não chegue às meias-finais da Liga Europa. Para isso, considerando a concorrência, os que la estão chegam, desde que sejam aproveitados.

Para ser campeão, o Benfica precisa de chegar a Março com os seus jogadores fundamentais – Luisão, Garay, Matic, Aimar, Gaitán, Salvio e Cardozo – a produzirem perto dos 100 por cento. Se isso não acontecer, não é por chegar mais um titular que o Benfica se safa.

O Bruno César não faz falta nenhuma – não é, nem nunca foi outra coisa senão um tique de novo-riquismo do Jesus, e o facto de aparecer algumas vezes no jornal, por jogar no Benfica, não invalida esta evidência – e o Nolito, apesar de eu continuar a achar que o Jesus não o soube aproveitar, também não, simplesmente porque nunca foi um jogador do Jesus mas do Rui Costa.

O Benfica tem o Gaitán e o Ola John, que jogam nos dois flancos, o Salvio, o Urreta, ao que parece, está a evoluir, e o Miguel Rosa, apesar de não ser grande espada e ser um jogador relativamente burro (até se enquadra bem…), tem rodagem e, com a moral que leva se for chamado à equipa principal, até é menino para decidir um jogo e dar uns pontintos.

Aquilo que o Benfica conseguiu foi, na verdade, equilibrar o plantel, ao retirar-lhe os excessos e subindo a responsabilidade aos jogadores que lá estão.

Repito: neste campeonato, em que o sexto leva 4-0 do primeiro, em casa, sem que o primeiro tenha de meter a quarta, este plantel chega. Se o Benfica vier a perder pontos inesperados não será por falta de jogadores, mas por falta de concentração ou por opções erradas por parte do Jesus – jogar com o melhor onze com o Leverkussen em vez de guardar jogadores para o campeonato, por exemplo, como aconteceu no ano passado antes do jogo em Coimbra, em que uma vitória teria dado o título ao Benfica.

Para mim, com o Leverkussen, é o jogo ideal para dar minutos ao Aimar, ao Luisinho, ao André Gomes, ao Urreta, ao Rodrigo, ao André Almeida. Para ninguém ter dúvidas nenhumas (começando pelos jogadores) sobre quais são as prioridades da época.

Aliás, para acabar com a minha habitual nota catastrofista, e após ver o desempenho da equipa nas últimas semanas, não tenho dúvidas nenhumas de que se o Benfica não for campeão esta época será pela exacta mesma razão que não foi na última: porque não quer. E como não quer, não vai fazer o suficiente por isso.

Quando há nem que seja uma hipótese em vinte do campeonato ser decidido «à Calabote», por goal-average, não se ganha 2-1 ao Moreirense quando se pode ganhar por 5-1, não se dá 3 ao Setúbal quando se pode dar 7 (e resolver logo, de uma vez por todas, a questão do goal-average), não se ganha 2-1 ao Braga, de aflitos, quando se tem a hipótese de fazer um resultado histórico – que é o que teria acontecido se o Benfica tem sabido jogar a segunda parte frente a este Braga.

Hoje, os jogadores do Benfica estavam a guardar-se exactamente para quê, que eu não percebo? Para o jantar? Para a folga?

O Aimar, por exemplo, entrou exactamente para quê? Para mostrar a camisola? Se foi para ganhar ritmo, o ritmo a que ele jogou tem é de ser perdido, porque, assim, nem para o Qatar serve.

Certo, não era preciso.

Daqui a umas semaninhas, quando me vierem falar de árbitros, voltamos a conversar sobre o que é preciso.

Mas não quero acabar com azedume. Afinal, o Benfica até ganhou. Prefiro salientar uma pequena nota que não é minimamente de desprezar quando se conjecturam cenários futuros de igual sucesso desportivo entre Benfica e Porto – o que não acontece neste momento. Se se pegasse na assistência que esteve ontem na Luz – num domingo à noite, no princípio de Fevereiro (e quem tem de pagar as contas da casa sabe ao que eu me refiro, porque os dois primeiros meses do ano, a seguir ao Natal, são sempre os piores), com um frio do caraças, frente a um Vitória de Setúbal fraquíssimo, com o Benfica sem ganhar nada de jeito há dois anos – e se a transplantasse para as Antas, o Porto teria feito uma das melhores casas da época.

P.S. - Aliás, fui confirmar, e esta época o Porto ainda não conseguiu meter 39 mil espectadores em casa em nenhum jogo. Nem com o Sporting.

14 comentários:

  1. patriarca disse:


    Excelente post, explana em "actos correctos" o desenrolar desportivo e dá umas "achegas" aos que andam sempre a grunhir pró lado ou não querem ver a realidade.
    O Benfica ganhou, é excelente.

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  2. O Matic foi contratado no mercado de Janeiro, no negócio do David Luiz, mesmo que só tenha vindo no Verão.
    Se um jogador como o Nolito que teve o rendimento que teve na passada época para o Benfica não serve, então quem é que serve, o Urreta ?
    Porque motivo dizes que o Miguel Rosa é burro ? Burro era o B. César ou o Urreta.

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    1. Miguel Rosa é bom. Na segunda Liga. o futebol das duas ligas não tem nada a ver. Se o metesse agora a fazer de Lima ou Salvio irias ver as dificuldades dele...

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    2. O Miguel Rosa tem vontade, tem carácter, fisicamente já tem estofo para jogar na primeira equipa, mas joga com pouco critério. Ainda no último jogo do Benfica B vi-o a pegar na bola a meio-campo, meter os cornos no chão, dar três passadas e rematar a trinta metros da baliza, em desequilíbrio.
      Para conseguir mais do que apenas ser uma solução para 10/15 minutos na equipa A teria de passar umas semanas a levar nas orelhas do Jesus. Para a próxima época, não digo que não possa subir de escalão. Para esta, já não serve para muito. Aliás, conhecendo o Jesus, se ele ficar, aposto que o Miguel Rosa, para o ano, está a jogar numa equipa do meio da tabela de Espanha ou na II Divisão inglesa.

      Queres mesmo saber? Gostei mais do puto brasileiro que jogou a ponta-de-lança (Davyerson, ou qualquer coisa do género, que do Miguel Rosa, e parece-me que até o Cavaleiro tem mais futebol que o Rosa.

      Sim, o Matic foi contratado em Janeiro, como outros, mas só integrou a equipa no Verão, e só começou a jogar, se te recordas, lá para o Natal. Não foi uma solução para a hora.


      Repara que eu gosto do Nolito. Até escrevi, no ano passado, que o Nolito deveria ser titular do Benfica. Mas, para o Jesus, o Nolito nunca serviu. Contra factos não há argumentos. Não se enquadrava no «sistema táctico», provavelmente...

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  3. Concordo com quase tudo.

    O Bruno César e o Nolito não são necessários e foram bem dispensados. O excesso de concorrência num clube é tão mau como o défice de concorrência. Nem é preciso explicar porquê. O facto do Nolito não caber nesta equipa apenas mostra, pelo menos para mim, que esta equipa é muito superior à do ano passado. E também não é preciso explicar porquê.

    Vou dizer algo que muita gente pensa mas não tem coragem para dizer. O Aimar
    já não tem pernas para jogar nesta equipa. Pity but true!

    Para aqueles que acham que a equipa podia e devia dar cabazadas todos os jogos, provavelmente serão os mesmos que criticam o JJ dizendo que ele "arrabenta" com as suas equipas até Março. Isto é, o homem é preso por ter cão e preso por não ter.

    Eu acho que estando o Benfica ainda em 4 competições, a gestão física e de saturação do plantel é cada vez mais importante.

    A não ser que façamos como os andrades e andemos a dar aos jogadores medicamentos que aumentam o desempenho físico. Como muito bem se tem visto, pelo menos para mim, nos últimos jogos do Porto, especialmente desde as férias do Natal.

    Estas coisas não acontecem por acaso. Assim como o desempenho de algumas equipas e de alguns atletas em alguns desportos, também não.


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    1. Concordo em relação ao Aimar.

      Passei-lhe a certidão de óbito no final da época passada. Mantenho intactas as minhas afirmações de que, numa equipa em construção, inexperiente em termos europeus e com défice de QI futebolístico como é a do Benfica, um jogador com cérebro, como o Aimar, é muito importante, e aceito perfeitamente que o Benfica o mantenha até final desta época (ou até mais, porque não?), mas, futebolisticamente, não só considero que o Aimar nunca foi o génio que o quiseram pintar - um bom jogador, sim, por vezes brilhante, com mais classe do que os outros, mas muito intermitente, pouco fiável, e não, de certeza, um génio - como acho que não pode ser mais que um bom segunda linha.

      O ponto é este: em que grande equipa da Europa é que este Aimar teria lugar? Para jogar 90 minutos quatro vezes por mês? Sem pôr en causa a dinâmica defensiva de uma equipa que precisa de defender alto?

      Gosto do Aimar, adorei vê-lo a ser campeão no Benfica com o Saviola - outro que passou de prazo há cerca de dois anos, porque começou muito novo na alta-roda - mas o máximo que se pode esperar de Aimar, neste momento, é que ganhe ritmo, que não rasgue nada, e que, tal como o Carlos Martins, nos jogos em casa em que o Jesus vai ter de rodar o meio-campo e ganhar, jogando a baixa rotação, desequilibre, permitindo que o Enzo Pérez, o Matic, o Gaitán e o Lima vão descansando uns minutos.

      Agora, se for para entrar e fazer figura de cavalinho de cortesia, como contra o Setúbal, mais vale ficar pela cabine e ajudar nas palestras.

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  4. Á lista de indispensáveis acrescentaria o Lima.O que me preocupa como adepto é que este fim de semana o Benfica tem um jogo num campo que é ideal para que seja cometido um daqueles crimes que também conhecemos.É um jogo importantissimo no qual a equipa terá que dar tudo.Só assim poderemos ganhar por mais que tentam tudo e mais alguma coisa pois não duvidem que até ao jogo no Ladrão na penúltima jornada vão tentar tudo para estar a frente do Glorioso.Porquê? Porque nos ultimos 20 anos, das pouquissimas vezes que jogamos no Ladrão/Antas em igualdade pontual ou em vantagem nunca perdemos (com excepção de 2010, com o título á vista).As vitórias dos azuis em casa sobre nós apenas acontecem quando já estão em vantagem no campeonato, tal como os picos de excelente forma deles surgem depois de não perderem na Luz ou até ganharem.Continuam e continuarão a utilizar o lado psicológico e o nome do Benfica para se ultrapassarem a sí mesmo.É a amostra da limitação dos seus pensamentos.Estão no topo da sua história mas continuam a sentir complexo para com um clube que está a saír da sua fase mais negra e a construir um novo futuro.Esperemos que este seja risonho...

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    1. Correção: "Tão bem conhecemos"... deve ser o stress : ))

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  5. O Goal Average só conta se o Benfica empatar no Dragão a 2 bolas. De resto, conta pouco, para não dizer, conta nada.

    mas concordo que devem sempre jogar para marcar mais 1. Sempre. Só assim os próximos adversários entram em campo derrotados.

    Abraço

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    1. Resultados dos últimos quatro jogos entre Benfica e Porto: 2-2, 2-3, 3-2 (na Taça da Liga do ano passado) e 2-2.

      «Que las hay, las hay...»

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  6. o andre gomes e os seus fantasticos jogos contra o freamunde hahahahahhahahahhah até pode vir a ser um grande jogador mas neste momento só paulo bento e jorge mendes sabem porque foi convocado.

    o andre martins por exemplo é melhor e já o mostrou varias vezes.

    PS - vai-te foder

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    1. SportingSempre:vai ver se eu estou ali em baixo.

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    2. SS, gaiolas à parte, tens de admitir que há uma linha que separa o voluntarismo do sado-masoquismo.

      Já aqui propus que o Benfica libertasse o Sporting do Elias e do André Martins (e só destes) mas o meu país não deixou.

      P.S. - Sempre que me é humanamente possível

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  7. Perfeitamente de acordo em relação aos jogadores que devem entrar no jogo contra o Leverkussen.O Triplete(Campeonato,Taça de Portugal e Taça da Liga) caía que nem gingas já este ano.

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