sexta-feira, 22 de junho de 2012

O valor acima

Moutinho está a fazer em 15 dias a época que não fez no Porto.

Coentrão beneficia de uma época de evolução e sem desgaste excessivo com o melhor treinador do Mundo, que, depois de Jesus, acabou de lhe tirar tudo o que ele tem para dar, assim como de um ambiente amigável – Coentrão é o típico jogador que precisa de carinho, mais que de exigências, para chegar ao seu melhor nível.

Meireles chega ao Europeu como jogador pleno, completamente maduro após ganhar o título europeu pelo Chelsea eliminando duas equipas superiores.

Pepe é um dos cinco melhores defesas do mundo, e, se juntarmos à especificidade o potencial generalista – o que pode render como central e como trinco – não hesito em considera-lo o melhor. Neste último aspecto, talvez só coloque perto do seu nível o espanhol Sérgio Ramos.

Uma questão incontornável: como, em 2004, Scolari beneficiou do trabalho de sapa feito por Mourinho no Porto – Costinha, Maniche… - este ano Paulo Bento beneficia do trabalho de sapa feito por Mourinho no Real Madrid. Pepe e Coentrão estão a um nível que a Selecção até resiste a um defesa-direito e a um guarda-redes de terceira linha europeia.

Ronaldo mostra que é um caso perfeitamente à parte no futebol mundial. Ninguém – repito, ninguém – conseguiria chegar ao décimo-primeiro (!) mês de uma época em que levou o Real Madrid às costas até ao triunfo sobre a melhor equipa do Mundo, num campeonato de 38 jornadas, e fazer dois jogos, em quatro dias, como os que Ronaldo fez na Polónia. Ninguém. Aos 70 minutos do jogo contra  República Checa, depois de dez minutos em que os jogadores andaram a correr para todos os lados, sobre um relvado mole e super-desgastante, num contra-ataque português Ronaldo acorre a um lançamento em profundidade com um sprint de mais de 40 metros. Perde-o, mas a imagem que é mostrada dele é de estar completamente à vontade fisicamente, respirando bem, costas direitinhas, como se fosse o décimo minuto de jogo.

Não sei se votaremos a ver um jogador tão distante dos outros como Ronaldo.

Pelé estava 30 anos adiantado ao relação aos jogadores do seu tempo tecnicamente – tal como Maradona, que fez em 86 o que Messi agora recria em 2012.

Cruyff estava 30 anos adiantado em relação aos outros jogadores tacticamente – e, hoje, a maior cultura futebolística do Mundo (a de Barcelona) é a que ele legou.

Ronaldo está 30 anos adiantado em relação aos outros jogadores fisicamente. E isto numa era em que um futebolista já é, acima de tudo, um atleta, e em que um jogador tecnicamente sofrível pode jogar nas melhores equipas do Mundo desde que tenha estofo mental e físico para isso. Ronaldo é a definitiva máquina de futebol, e será o protótipo que os futuros formadores tentarão criar. Será precisa uma geração para que comecem a aparecer equipa com dois ou três Ronaldos, que vão fazer o Ronaldo parecer normal.

Até agora acertei em todos os jogos da Selecção neste Europeu: derrota curta com a Alemanha; vitória frente à Dinamarca e vitória frente a uma Holanda que tinha «desastre nuclear» escrito nas camisolas desde que chegou à Ucrânia e os seus jogadores começaram a dizer que não tinham de se dar bem para ganharem. Quando se vê jogadores a baixarem os calções a outros e a mandar SMS’s durante o aquecimento do jogo com Portugal não há grande margem de dúvida sobre aquilo de que uns querem e os outros não querem saber. Contra a República Checa até previ o resultado: 1-0.

Neste momento, penso que Portugal vai jogar a final deste Europeu frente à Alemanha. Penso que a França vai enganar a Espanha e, sem ser melhor equipa, vai ganhar e jogar as meias-finais connosco. Chegará aí como favorita, por ter ganho à Espanha, mas perderá, pelas seguintes razões:

- porque terá um jogo mais difícil de encaixar, como equipa em construção que é, contra um adversário a quem tem de marcar do que contra uma Espanha que terá toda a carga do jogo em cima de si;

- porque Portugal jogará muito mais concentrado do que a Espanha;

- porque esta equipa portuguesa estará no seu ambiente mais favorável – contra tudo e contra todos, a poder jogar em contra-ataque, contra um adversário que se encontrará a competir um nível acima da sua capacidade, tal como Portugal, mas de quem, ao contrário de Portugal, se exigirá aquilo que ainda não está preparado para dar.

A final é o limite para esta equipa inventada por Paulo Bento.

A final será jogada e perdida com a Alemanha. As limitações portuguesas podem ser disfarçadas em contextos favoráveis, como têm sido os que encontrou até agora e que provavelmente encontrará na meia-final, mas serão fatais na final.

A Alemanha é uma equipa estruturada, feita para competir neste tipo de competições e para ganhar. Desta selecção alemã provavelmente só três ou quatro jogadores é que teriam, individualmente, lugar na Selecção portuguesa, mas, colectivamente, só Ronaldo jogaria pela Alemanha. A Alemanha não constrói equpas para competir: constrói equipa para ganhar. Por isso, ou falha rotundamente ou ganha (e, se não ganha, anda lá perto). A diferença entre uma selecção alemã banal e uma selecção alemã campeã do Mundo ou da Europa é meia-dúzia de mecanismos colectivos que uma não consegue fazer e a outra consegue.

Este Portugal é o contrário: uma manta de retalhos que Bento coseu, com maestria, desde que substituiu Queirós (que bela merda de homem que ali está, diga-se de passagem. O Manuel José é que tem razão: o Queirós não vale um cagalhão do Paulo Bento). Vai chegar à praia, mas nem este colectivo efémero poderá resistir, num jogo de exigência máxima e fora de todos os antecedentes históricos, a lacunas incontornáveis como a fragilidade defensiva na lateral-direita, a falta de poder físico do meio-campo, a inexistência do outro jogador fundamental de Portugal (Nani) ou de um ponta-de-lança que seja, sequer, de segunda linha europeia. Não é possível que uma equipa como a portuguesa possa ganhar um Campeonato da Europa – a não ser que joguemos a final com a Grécia, claro (que é o meu sonho molhado, com a tal cena dos 24 Lisboas no centro do campo, como já referi há dias…).

Portugal tem uma equipa sem rotina, sem maturidade e sem eficácia. Contra a Dinamarca temos o jogo ganho e perdemo-lo antes de o ir buscar outra vez ao fundo do poço. Contra a Holanda, que tem a defesa mais banal do Europeu, perdemos 10 golos para fazer 2 e ainda ganhar – algo que só pode acontecer contra a Holanda. Contra a República Checa perdemos 45 minutos e quase fomos a penáltis e prolongamento por não termos jogadores em campo suficientemente maduros, como equipa, e inteligentes para perceber que bastava subir 10 metros para banalizar e subjugar facilmente um adversário mais fraco que a Dinamarca e claramente a jogar num grau de dificuldade acima das suas possibilidades.

Chegará, eventualmente, para ir à final, com sorte. Não para ser campeão europeu.

A Grécia que ganhou em 2004, por exemplo, não tendo senão estratégia defensiva, era uma equipa coriácea, experiente, batida, que sabia ler perfeitamente todos os momentos do jogo. Esta equipa portuguesa, não.

Dito tudo isto, e garantindo já que sofrerei até ao fim, tenho de dizer que estes jogadores ganharam um lugar na «minha» equipa, e que só sinto gratidão. Não por estarem a ganhar (claro que é por estarem a ganhar, mas a questão não é só essa) mas por terem devolvido a Selecção ao país real, depois dos Queirozes e dos Merdagiles a terem conspurcado e deitado fora uma ligação de quatro anos como nunca antes tinha havido e que devolveu a auto-estima ao país.

Sinto-me grato a Paulo Bento, a Ronaldo, a Moutinho, ao Pepe, ao Bruno Alves, e estou felicíssimo por poder dizer que me estou borrifando para as benfiquites. É para isto que a Selecção existe: para mostrar que há um valor acima, e que há mais a unir-nos que a separar-nos. Sinto-me feliz por poder dizer que sinto que a Selecção Nacional é sagrada, e que sinto que ela está acima do Benfica. Não me sentiria feliz se não fosse verdade, mas é. Vejo os meus filhos pintados de verde e vermelho e sinto-o.

Sinto-me feliz por poder dizer que, em minha casa, ninguém fala mal do Ricardo, porque me deu o melhor momento da minha vida desportiva; nem do Scolari, que é mais português que milhões deles, incluindo a valente merda que é o Pinto da Costa, um homem a quem odeio, também, por durante 30 anos ter colocado a Selecção do meu país ao serviço da valente merda da sua máfia, graças a biltres como os Merdagis; nem do Deco, que, no Portugal-Inglaterra que eu vi ao vivo com a minha mulher e o meu pai, no meio de dezenas de ingleses, na terceira fila a contar do fim do Terceiro Anel do Estádio da Luz, fez, em 120 minutos, a médio-ofensivo, médio-defensivo e defesa-direito, o jogo mais grandioso a que já assisti de um jogador com a camisola portuguesa vestida, incluindo Figos, Ronaldos ou Ruis Costas.

E quero um palanque com os jogadores todos lá em cima, no meio de Lisboa, quando voltarem, para poder ir dizer «obrigado».

3 comentários:

  1. Eu estou completamente rendido à selecção tanto mais que as minhas expectativas eram muito baixas.Mas quero ganhar aos boches pois não posso com eles.

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  2. LeBron... Conseguiu finalmente!

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  3. Sou tendencialmente contra esta seleção. Detesto Paulo Bento, um tipo que é um excelente exemplo de que a teimosia é pior que a cegueira. Irrita-me seriamente ver personalidades sem dimensão futebolística que o justifique, como o Patrício, João Pereira, Rolandos ou Micaeis, ou esses supra-sumos, Postiga e Almeida, apontados como exemplo do que a pátria tem de melhor em termos futebolísticos.
    Esta seleção não deixa, ainda assim, de ter jogadores absolutamente fora do normal. Eu acho que as figuras são 4: Coentrão, Moutinho, Pepe e um Ronaldo que é, de facto, um atleta e futebolista absolutamente ímpar.

    Apesar de tudo, chegar às 4 melhores equipas da Europa é, por si só, um feito futebolistico. Se considerarmos que a Holanda perdeu os 3 jogos, talvez o feito mais díficil conseguido neste europeu tenha sido a vitória à Dinamarca, o que não é feito particularmente relevante. Os checos foram uma equipa muito fraquinha, que conseguiram o feito de nem sequer terem rematado à baliza! Por isso, aquilo que verdadeiramente definirá esta seleção, aos meus humildes olhos, é o que fizer na meia final. Ganhar à Espanha, isso sim, será anormal e será um desempenho acima do esperado. Perder com a Espanha, apesar do 3º ou 4º lugar que daí possa resultar, será normal, mas também significará que não há nada que agradecer, porque a seleção terá feito aquilo que lhe seria exígivel - vencer equipas futebolisticamente inferiores - perdendo, uma vez mais, contra aquelas a que só ganhariam em superação. Nada de anormal, portanto. Nada que justifique palanques, IMO.

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