quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Não é cultura de vitória, é cultura de exigência


Correu muito bem, em Braga.

Jogaram uma série de jogadores que vão fazer falta no próximo mês (Jardel, André Almeida, Aimar, Carlos Martins, Urreta, Aimar, Rodrigo); o Benfica aguentou-se bem, com uma equipa de suplentes contra a equipa principal do Braga, até aos penáltis; como disse o Pinto da Costa o ano passado, desta já se livrou, é menos um jogo, numa competição em que, após quatro anos a vencer, e encarando friamente, tinha muito mais a perder do que a ganhar; toda a gente viu o o Braga a festejar a passagem à final da «Taça da Cerveja» como se se tivesse apurado para a Champions (com o bónus de se poder ouvir o Luisão a gozar com eles na flash interview – «para o que estão a fazer têm mesmo de comemorar»…) e, se Deus quiser, ainda haveremos de ver este Braga a jogar com o Porto na final da tal Taça que não conta para nada e que, certamente, nenhuma das duas equipas quererá ganhar. Mais um jogo para o Porto (com o do Rio Ave já são dois, tendo o do Rio Ave de ser metido à pressão entre duas jornadas do campeonato) é bom para equilibrar um pouco a contabilidade de minutos.

A jornada europeia, veremos. Continuo a dizer que preferia que o Bayer tivesse passado e que o Benfica ficasse apenas com o campeonato para jogar, sobretudo depois do resultado do Porto, que quase lhes garante a passagem na Champions. As hipóteses de sucesso do Benfica no campeonato passam por aí. O Jesus tem toda a razão, como é evidente, por mais que os comentadores da treta ou os adeptos irrealistas insistam no contrário: a incompatibilidade entre uma época de sucesso a nível interno e externo é uma evidência histórica. Apenas muito pontualmente, e com equipas de muito alto nível, se consegue juntar as duas. O argumento de que o Porto o fez com Mourinho e Villas-Boas é falacioso. Em ambos os casos o sucesso internacional só foi possível porque, a nível interno, o campeonato já estava decidido no Natal. E convém não esquecer que o caso da fruta e do Jacinto Paixão (o Pinto da Costa sabe do que se trata porque ouviu as escutas no You Tube, e, como ele disse, aparecia lá o Vieira a falar do João Ferreira, pelo que o que foi posto na Net deve ser verdade…) deu-se precisamente num jogo com o Beira-Mar antes de uma eliminatória europeia (com o Panathinaikos ou com o Corunha), para garantir que tudo corria bem.

A única coisa boa na passagem da eliminatória é que, se o Porto não perder pontos nas próximas jornadas – como é bem possível – o Benfica pode ter na Liga Europa uma hipótese de prolongar a época. O Bordéus é muito fraquinho, muito mais fraco que o Bayer Leverkussen, e, mesmo considerando que o Bayer deu a primeira mão da eliminatória de barato, terá poucas hipóteses contra um Benfica normal.

Uma época com uma vitória na Taça de Portugal, um segundo lugar no campeonato e uma presença nas meias-finais da Liga Europa, por exemplo, seria uma época muito respeitável. Não há por que negá-lo.

A este propósito, convém recuperar aquele momento em que o Jesus pôs a sua cara de inteligente, há uns dias, e disse que o Benfica é um clube com cultura de vitória.

Antes de mais, deve dizer-se que as palavras falam pouco. O que fala são as acções. O Jesus pôs todos os suplentes que pôde frente ao Braga, o que traduz a importância relativa da Taça da Liga na perspectiva geral, e fez muito bem. E isso não impediu a equipa de jogar para ganhar. O Benfica não entregou o jogo. Facilitou, obviamente, mas não o entregou.

Depois, há duas questões diferentes.

A primeira é a de que o Benfica não tem, actualmente, uma cultura de vitória. E devo dizer que já não a tem há muito, muito tempo. Deixou-a deslassar a partir sensivelmente de meados da década de 80. O que o Benfica tem tido, esporadicamente, desde então, é algumas equipas que vão ganhando o hábito de ganhar e, muito mais vezes, equipas que tentam não perder. É muito diferente ter uma equipa que vai ganhando o hábito de ganhar (que era aquilo a que o Jesus se estava realmente a referir, confundindo o Benfica com a equipa que ele acha que é a sua equipa, a que ele inventou desde que chegou) e ter um clube com a cultura de vitória. Esta equipa tem fomentado, mais que todas as outras desde Eriksson, o hábito de ganhar jogos, o que a torna, por si só, na melhor dos últimos 25 anos, mas o clube está muito longe de ter recuperado a sua cultura de vitória. E isto por causa da segunda questão.

A segunda questão, que o Jesus (porque sempre foi sportinguista) e a maior parte dos benfiquistas ainda não conseguiram entender, é que a cultura do Benfica nunca foi, realmente, uma cultura de vitória: foi, sim, originalmente, uma cultura de trabalho e de espírito de superação. Foi daí que surgiram as vitórias, mas não, note-se, uma verdadeira cultura de vitória. As vitórias, no Benfica, nasceram do sacrifício colectivo, do trabalho, e a própria humildade de base na cultura benfiquista (popular, inculta, generosa mas pouco ambiciosa, pouco aristocrática) impediu o clube de adquirir uma cultura de vitória que o tornasse, por exemplo, no que hoje é um Barcelona ou um Real Madrid.

A verdadeira essência do Benfica, mais do que ser uma potência dominadora (quando chegou a altura de dominar, o clube veio a cair no deslumbramento e no novo-riquismo que ainda hoje o domina), é triunfar apesar das adversidades.

Dificilmente veremos no Benfica, algum dia, a aura aristocrática de um Real Madrid, aquela nobreza que parece natural, o sangue azul que parece estar na própria base da altivez desse clube. Mais facilmente veremos o Benfica, novamente, a aparecer entre os grandes em situações desfavoráveis e, depois, a recuar novamente. Seria preciso, para que assim não fosse, que houvesse uma grande revolução cultural entre a massa adepta do Benfica para, no espaço de uma geração, conquistar esse ADN dos que se se sentem realmente melhores que os outros. Não o sentimos. Sentimos que lhes podemos ganhar, isso sim. Mas não que somos naturalmente tão bons como eles.

Independentemente disto, o que interessa é que a cultura do Benfica é a da superação, da exigência acima do normal, acima do vulgar, e não a «cultura de vitória». É isso que o Jesus não entende, e é isso que me leva a não me rever, ainda, nesta «equipa do Jesus».

Esta equipa não reflecte a verdadeira cultura do Benfica. Exige pouco de si própria. Não tenta superar-se o suficiente. Resigna-se com demasiada facilidade. Aspira a pouco.

Não é que exija pouco, que não se tente superar ou que se resigne facilmente. Não é isso. Apenas o faz a níveis normais para qualquer equipa normal no mundo. E o que tornou o Benfica imenso foi precisamente isso: o Benfica não é apenas normal.

Quando vejo um colunista, no Record, a dizer que o Benfica precisa mais do Jesus que o Jesus do Benfica fico com os cabelos arrepiados. Porque esta gente, tão inteligente, não chega lá. Não percebe que um clube como os outros, que nasce no meio dos outros, não se torna tão maior do que os outros apenas por fazer o que os outros fazem, ou por pensar como os outros pensam.

O Benfica ergueu-se acima dos restantes a fazer o que parecia impossível. Não foi apenas «gestão». Foi devoção.

Dito tudo isto, o Benfica, como clube, teria «cultura» para jogar tudo e ganhar tudo, sem ter de abdicar de nada? Teria. Mas não com esta equipa.

10 comentários:

  1. Também acho bem as poupanças.

    Gostaria de um post teu sobre os 80M. :P

    Abraço

    ResponderEliminar
  2. JJ é o primeiro a não entender o ADN do GLORIOSO.

    ResponderEliminar
  3. Ulrich Haberland28/02/2013, 01:02:00

    Excelente postadela.

    "Sentimos que lhes podemos ganhar, isso sim. Mas não que somos naturalmente tão bons como eles." Por outras palavras, somos um clube português. É o ADN do povo português, infelizmente.

    Concordo, na generalidade, com o que dizes mas, curiosamente, acho que o JJ chegou cá cheio de "clube vitorioso" mas depois a dura realidade foi conduzindo-o para "um clube vencedor" (dinheiro, vendas, direcção, etc).

    Mais do que com JJ acho que com esta direcção nunca seremos um clube "vitorioso" apenas, às vezes, "ganhador".

    ResponderEliminar
  4. po c........ o benfica não precisa do jj nem do orelhas não caio no idolatrismo humano e orgulho me disso não idolatro ninguém o ke o benfica precisa e deganhr o campeonato e a taça de Portugal nai nada e ir o mais longe possível na liga europa e já aogra o ke faz o aimar no benfica ke va po c....................

    ResponderEliminar
  5. Tretas e mais tretas. Uma colecção de pretensa "intelectualidades", tão típicas do português, especialmente de uma determinada esquerda intelectualóide que não sabe bem o que quer ou o que diz - que eu não insinuo que o Hugo seja - tentando explicar o que é simples e linear através de arabescos.

    Gostava que me explicassem, mas muito bem explicadinho pois tenho dificuldades de interpretação, o que significa, "cultura de vitória", "cultura de exigência", "cultura táctica", "cultura benfiquista" e outras expressões tão utilizadas por pessoas que, paineleiros encartados da TV, atiram descaradamente às caras das pessoas pensando que assim, com frases e "clichés" que ninguém entende, lhes dêem a supremacia a que aspiram e o tacho que querem manter.

    Parece o "antigamente" dos padres gritando com os "fiéis", ameaçando-os com o inferno, dominando-os com a "confissão", ou os advogados, do alto do seu conhecimento das leis impenetráveis, que eles próprios fizeram, mantendo o portuguesinho bem alinhado e dominado, de chapéu na mão e cabeça caída, dizendo, "amén!" e "sim, sr. doutor!"

    O Benfica ontem foi eliminado porque o árbitro não marcou 3 penalties que devia ter marcado. Tão simples como isso! Ou, se quiserem, que o Rodrigo devia ter marcado numa das 2 ocasiões que teve! O resto são bolotas para papalvos!

    O JJ esteve muito bem na gestão do plantel - o campeonato é o mais importante - a equipa não esteve mal dado os condicionantes, utilizou os jogadores portugueses que teve de utilizar pelas regras da competição, é um grande treinador que percebe mais de "cultura táctica" e de "sede de vitória" do que qualquer outro.

    É por isso que, por terem falta de "cultura táctica", "cultura de vitória" e de "cultura de exigência", os jogadores e o treinador do Benfica vão ganhar a Taça e o campeonato!

    PS. O LFV tem de contratar um especialista para determinar o que é o ADN do Benfica. Toda a gente fala nele mas ainda ninguém o encontrou! lol!




    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Parece o "antigamente" dos padres gritando com os "fiéis", ameaçando-os com o inferno, dominando-os com a "confissão", ou os advogados, do alto do seu conhecimento das leis impenetráveis, que eles próprios fizeram, mantendo o portuguesinho bem alinhado e dominado, de chapéu na mão e cabeça caída, dizendo, "amén!" e "sim, sr. doutor!"

      FALA UM TEMENTE A VIEIRA. QUE LATA.

      Eliminar
  6. O que me interessa é que hoje o GRANDE BENFICA faz 109 anos.

    Partiu de um sonho de Cosme Damião e tornou-se naquilo em que é hoje. O nosso genuínio amor.

    Parabéns ao SPORT LISBOA E BENFICA.

    Abraço,
    RS

    ResponderEliminar
  7. Para mim,que sou um mestiço cultural,e que adoro a minha cultura africana e a minha cultura portuguesa,acho incrível que o ídolo máximo do meu Clube,com estátua à frente do Estádio,seja um mestiço,com Mãe preta(mamana) e Pai Português.Como diria o outro,Deus fez o Homem e o Tuga fez o mestiço.Logicamente que tu e eu temos visões diferentes do nosso Benfica mas deixa-me dizer-te que vou contigo nessa visão que tens dele.É inteligente e estratégico.Esperemos que haja alguém actualmente nos quadros do Clube,e que tenha algum voto na matéria,que leia o teu Blog.Gostaria que te levassem a sério como muita malta que vem aqui ler e comentar,te leva.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sou leitor assíduo. Raramente comento porque não consigo arranjar palavras que acrescentem alguma coisa ao que o Hugo escreve, mesmo não concordando com tudo.
      Assim limito-me a ler e a aplaudir interiormente o que por aqui se vai dizendo.

      Eliminar
  8. "um clube como os outros, que nasce no meio dos outros, não se torna tão maior do que os outros apenas por fazer o que os outros fazem, ou por pensar como os outros pensam."

    Perfeito.

    ResponderEliminar