Coloquemos a coisa desta forma: se eu pertencesse ao
directório do Benfica e controlasse o Conselho de Disciplina, as decisões
tomadas nesta reunião de 4.ª feira teriam sido praticamente as mesmas que foram
anunciadas.
Não há razões objectivas para a despenalização de Matic. O
árbitro considerou jogo violento e não há, nas imagens, prova em contrário.
Apenas a sensação clara de que o jogador do Nacional desproporcionou e tirou
proveito da situação. Um jogo de descanso para o Matic, frente à Académica, até
pode ser positivo. Andam há um mês a ver se o expulsam, o Proença fez-lhes a
vontade, mas os danos são mínimos, e até é favorável, em termos de opinião
pública, que a expulsão ocorra numa situação muito duvidosa. O Benfica está a fazer o
seu papel, insinuando que a expulsão foi injusta, e, neste caso, terá ganho
munições, assim saiba fazer o seu papel de prejudicado.
Para o Cardozo, o ideal teria sido levar dois jogos. A
expulsão e o castigo, como já escrevi, eram inevitáveis, e o gesto de puxar o
árbitro não deveria passar em claro, mesmo não sendo, realmente, uma agressão
ou tentativa disso. Castigar o Cardozo apenas com um jogo limpa a segunda parte
da cena, e isso é estranho – mesmo que seja defensável, por parte do Conselho,
com a norma aplicada.
Um jogo pela expulsão e um jogo pelo puxão, teriam tido a
virtude de, por um lado, colocar o Benfica mais a salvo de insinuações de
domínio sobre o CD, e, por outro, reduziria o castigo a um mínimo razoável. O
Benfica teria passado por este caso podendo dizer que não está acima da lei
(ficando, assim, com a razão moral do seu lado) apesar de colher os benefícios
da benevolência dessa mesma lei. Em termos futuros, teria sido mais útil, e em
termos imediatos não haveria grande diferença – se for por não jogar o Cardozo
que o Benfica não ganha à Académica ou ao Paços de Ferreira em casa, então não há
nada que esta equipa possa, realmente, ganhar.
Quanto ao indulto ao Porto, é perfeito.
Em boa verdade – e ao contrário da manipulação de calendário
do jogo com o Setúbal, que pode ter influência no campeonato –, todo o caso é uma mera esquisitice. Eliminar o
Porto por causa de 15 minutos e de pôr a jogar três jogadores que nunca actuam
pela equipa principal (caramba, se tivessem posto o James, o Jackson e o
Moutinho para se apurarem, agora o Fabiano, o Abdoulaye e o Sebá…) é uma
aberração jurídica. Aí, o Porto tem razão. Mas o que é um facto, e o que torna
o caso realmente interessante, é que, mesmo sendo injusta, a decisão certa, de
acordo com a norma, só podia ser a de dar a derrota ao Porto. Ou seja, houve
uma subversão da norma em benefício do Porto. O resto são advogados a falar (e
podem estar mais vinte anos a falar sem que algum dos lados ache que perdeu a
razão).
Isso, para o Benfica, é bom.
Melhor ainda é que o Porto passe a ter mais dois jogos no
calendário.
Além disso, como já aqui escrevi, meio a gozar, mas a falar
sério, que é preciso que uma das equipas do regime ganhe a Taça da Liga para os
três (quatro?) títulos do Benfica serem valorizados. A Taça da Liga está numa
fase de afirmação, em que importa mais o seu prestígio do que o
troféu em si.
Neste momento, e até pelo contexto competitivo em que está
inserido, não há melhor cenário para o Benfica, nesta Taça da Liga, que ver Porto
e Braga disputá-la numa final fratricida (e de preferência com erros escandalosos
de arbitragem, muita vaselina e luvas de látex, como no jogo do campeonato).
Se eu fosse do Benfica e mandasse no CD, tinha inventado
quaisquer justificações para manter o Porto na Taça da Liga, e quanto mais
contra a lei melhor, para que se ficasse com a ideia de que se estava a passar por cima da lei para beneficiar o Porto.
Este caso é interessante, sobretudo, porque, pela
coincidência de casos, vem abrir uma hostilidade que, no futuro, com a rebipolarização do futebol português, é
inevitável, e que já aconteceu durante uma parte dos anos 90. Falo do controlo
dos Conselhos de Arbitragem, de Disciplina e de Justiça da FPF.
Não estamos em condições de dizer qual dos dois clubes é que
tem, neste momento, mais peso no C. Disciplina, mas tenho a certeza de que este
é apenas um primeiro caso, no pós-Apito Dourado, de muitos em que a vantagem
dentro do campo será condicionada pela vantagem nos gabinetes e nestas reuniões
de 4.ª feira.
A ideia de que o Conselho aproveitou para beneficiar os dois
clubes, compensando cada um pelo benefício dado ao outro, não me convence
minimamente. Tenho a certeza de que o Conselho de Disciplina nem é independente
nem é neutral, nem isento. Estou seguro de que há muitas pressões para o
controlar, e que esse controlo está em andamento. Só não sabemos, ainda, quem o
controla. Mas o seguimento que este caso vai ter, em termos de opinião pública,
e quando ocorrerem outros casos, torná-lo-á claro. Estas decisões não foram
tomadas para beneficiar os dois clubes: foram tomadas para, no futuro, ao
beneficiar um dos clubes e prejudicar outro, serem usadas como argumento de
idoneidade. Dir-se-á: «Mas, se nós queremos prejudicar o clube ‘x’, por que é
que naquela situação o beneficiámos tão claramente?» Podem esperar. Esta decisão
não foi uma decisão, foi um álibi para o futuro.
Se eu tivesse de apostar, agora, em qual dos dois está a trabalhar melhor o CD, até pelo que já
disse, apostaria mais no Benfica. Mas está tudo em aberto. O Porto não é de
facilitar nestas coisas, e trabalha a longo prazo.
Certo é que ambos estão, desde há muitos meses, a mexer-se
para garantirem o domínio da nova ordem que advirá da passagem para a FPF da
Arbitragem e da Disciplina.
Aos mais novos deve ser tornado claro uma coisa: a Liga Profissional
de Futebol não surgiu devido ao grau de sofisticação, de boa vontade ou de súbita
iluminação empresarial dos dirigentes. Ela surgiu porque a corrupção dos vários
Conselhos dentro da Federação atingiu tal ponto, era de tal forma escandalosa,
a ditadura do Porto era de tal forma esmagadora, que se tornou necessário
arranjar maneira de lavar a situação. A criação da Liga (algo que estava na
moda na Europa, nessa altura) e a passagem da Arbitragem, Disciplina e Justiça
para a Liga foi a forma de mudar tudo para que tudo pudesse continuar na mesma.
Falava-se da Liga como se, de repente, as pessoas fossem
mudar de carácter porque mudavam de sala, mas os dirigentes eram os mesmos, os árbitros
eram os mesmos, os processos eram os mesmos, e poucos anos depois a escumalha
que estava num lado (como algumas caras novas, como o Valentim Loureiro) já
tinha passado para o outro, bem instalada na sede da Liga, no Porto. Talvez não
saibam, ou não se lembrem, mas até o Pinto da Costa se deu ao luxo de ser
presidente da Liga, apoiado pelo Manuel Damásio, o pior presidente na história
do Benfica (sim, leram bem, o pior, e um dia falaremos disso).
O que se está a passar agora é a mesma coisa, mas com uma
diferença. Enquanto naquela altura o que estava em curso era um fortalecimento
óbvio do Porto, através da legitimação dos processos que esse clube usava para
dominar o futebol português, por via de uma nova associação voluntária de TODOS
os clubes, hoje, após o recuo imposto pelo Apito Dourado, e do confronto aberto
com um Benfica de Vieira em fortalecimento, o que está em causa é a supremacia
sobre a nova hierarquia, com o Porto a partir em vantagem, por motivos históricos e por causa de Pinto da Costa, mas a não estar
claramente acima.
Mais que saber quem manda, hoje, no Vítor Pereira (o
presidente do CA…), o que está em causa é sabe quem vai mandar nos vários Conselhos daqui por
dois/três anos. É aí que há muitos pontos a ganhar. Foi aí que o Porto fez realmente
a diferença na década de 90, passando-se de uma realidade em que as duas
equipas ganhavam os campeonatos alternadamente para outro em que o Porto (com
piores jogadores, note-se) passou a ganhar oito em dez, e o Benfica um em dez. Os
sucessivos benefícios transformaram uma diferença mínima numa superioridade
constante que, depois, se transformou numa hegemonia intocável.
A grande subtileza deste caso está nas duas últimas palavras
do comunicado do CD, quando se fala na impossibilidade de fazer uma
«interpretação extensiva» da norma constante no artigo.
Fazer uma «interpretação extensiva» da lei significa que, ao
aplicar a norma jurídica ao caso, o decisor considera que, ao criar a lei, o
legislador deixou a letra da lei aquém do espírito da lei (do pensamento e das
intenções que a originam), e que, como tal, aquele que a interpreta deve dar
mais importância ao espírito da lei do que ao que nela está escrito.
O CD optou por uma interpretação literal da lei, considerando
que a letra da lei reflecte inteiramente o espírito que lhe está subjacente.
Também poderia ter optado por fazer uma interpretação
restrita da lei – concluindo que o espírito da lei ficaria aquém da letra da
lei.
É indiferente.
A subtileza, aqui, é que toda e qualquer norma jurídica tem
de ser interpretada, e os vários tipos de interpretação permitem, a quem
decide, interpretá-la como acharem melhor – ou como der mais jeito. Quem pensa
que a lei é unívoca, está doido. A lei é o instrumento dos habilidosos e dos despudorados.
E é por isto que é importante controlar os homens que
interpretam as leis. Porque, estando lá postos, eles não precisam de se
justificar perante ninguém para fazerem o que querem. E fazem-no agindo dentro da lei, e com a força coerciva do seu lado.
A lei é sempre uma interpretação. E quando a lei não serve a
ética ou o interesse comum, mas interesses particulares, a corrupção está
instalada.
Este caso, em que os interesses particulares foram colocados
acima da ética, e em conjunto com o clima de guerra civil latente é, para mim, liminar: vem aí mais um ciclo de
pouca vergonha.
E os dois meses ao Luisão?
ResponderEliminarÉ um bocado triste ter que controlar para não ser controlado... O futebol não devia ser assim. Mas, enfim, oxalá os dirigentes do Benfica trabalhem bem nos bastidores e estabeleçam influência juntos dos Conselhos.
ResponderEliminar"é preciso que uma das equipas do regime ganhe a Taça da Liga para os três (quatro?) títulos do Benfica serem valorizados. A Taça da Liga está numa fase de afirmação, em que importa mais o seu prestígio do que o troféu em si."
ResponderEliminar-Já não bastaram os últimos três anos? Tem de ser outra vez a equipa do regime a ganhar?
" a decisão certa, de acordo com a norma, só podia ser a de dar a derrota ao Porto."
-porquê, porque sim? Eliminar um clube de uma competição por uma regra que não está presente em lado algum no regulamento dessa mesma competição?
Eheheh vermelho direto da sempre 2 jogos, mas para alguns dá um jogo e quase que ainda se pedem desculpas pelo ultraje. Isto depois de um dos expulsos ainda ir pedir satisfações ao arbitro em vez de abandonar o campo e puxar-lhe a camisola por trás.
Ao ler estes teus comentários fico com a certeza de que não tens a mínima ideia do que é o futebol português. Estás no blog errado...
EliminarDos factos que referi, algum erro?
EliminarNão? Bem me parecia.
Há um erro teu:vieste procurar-me cá em cima mas eu estava lá em baixo.
Eliminar- http://benficatedebaixodagua.blogspot.pt/p/salazar-e-o-mito.html
Eliminarainda acreditas na história da cegonha?!
-http://www.youtube.com/watch?v=lN7SKLlOVf4
vocês é que têm respeito pelos árbitros, vê lá...
ao anonimo que diz vermelho directo da 2 jogos
Eliminarque eu saiba corrupcao da descida de divisao que eu saiba dar 3 peitadas ao arbitro da meses de suspensao que eu saiba atirar botas ao arbitro idem por isso nao abra a boca pk o seu club nem devia existir.
"A Lei é sempre uma interpretação". Correcto, mas isso acontece em países corruptos como em PORTUGAL!
ResponderEliminarEm países a que eu chamo civilizados isso não acontece. A lei é aplicada e "não há mas, nem meio mas".
Que o Porto está a perder influência viu-se na golpada desesperada do assalto à sede da FPF com a retirada dos computadores. Um assalto como outros iguais perpetrados pelos mesmos.
Foi um acto com a manifesta intenção de amedrontar, agora que as putas e as respectivas filmagens comprometedoras acabaram. Só se amedronta (ou se faz chantagem) quando se está com receio de perder o poder.
Tens que tirar a lã dos olhos, mas alguem duvida de quem controla?
ResponderEliminarse tens duvidas vê.
http://pluribusunum7.blogspot.pt/2013/02/o-maior-pesadelo-do-fc-porto-sao-os.html
Não há dúvida que as tuas estatísticas, que são factos, dizem tudo e mostram eloquentemente que a correlação de forças ainda não está nivelada. E ainda há desmiolados que "exigem" os dirigentes do Benfica a falar. Seria bonito...
EliminarMas estão a perder força. Its´s a "dead cat bounce"...