quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Metafísicas à parte (I)


Deixemos as metafísicas de lado, por hoje (só por hoje…), e falemos de resultados.

Ontem, na «coluna-Gestapo» que o Record tem no lado esquerdo da página inicial da secção atribuída a cada um dos grandes – aquela em que os jornalistas que «acompanham» o dia-a-dia da equipa escrevem dois ou três parágrafos dignos de figurar num qualquer facebook das claques respectivas – o João Qualquer Coisa Rodrigues chamava a atenção para a necessidade de não ser demasiado exigente com o Jesus e com a equipa do Benfica, dados os resultados alcançados até agora.

«Não se deve deitar a perder tudo o que já foi alcançado por causa de pormenores como o goal-average», escrevia o Qualquer Coisa Rodrigues, notando que o Benfica estava em primeiro no campeonato, (praticamente) na final da Taça, nas meias-finais da Taça da Liga e nos 16-avos da Liga Europa.

É o tipo de coisa que se espera encontrar na coluna-Gestapo.

(Abrindo um parêntesis, a lógica da coluna-Gestapo é a seguinte:

- os jornalistas dos desportivos têm de levar com as máquinas de propaganda azul-vermelha-verde todos os dias, e têm de as confrontar com rumores quase todos os dias. Também estão sujeitos a pressões, todos os dias, por parte dos adeptos. Ser um «jornalista de grande» é um ofício diário de pressão e negociação, com tudo e com todos, até dentro das respectivas redacções.

De um «jornalista de grande» não se espera grandes notícias, não se espera objectividade e nem sequer se espera que diga a verdade. A função do «jornalista de grande» não é denunciar casos nem criar assuntos mas manter uma máquina de fabricação de caracteres e preenchimento de colunas que venda jornais, 24 horas por dia, 7 dias por semana. É a economia. Ocasionalmente (muito ocasionalmente), o que mantém a máquina a funcionar é a verdade, ou a objectividade, e lá aparece uma notícia relevante. Se querem saber a verdade, ou algo aproximado, sobre os clubes grandes, têm de esperar que os jornalistas não comprometidos lá cheguem. Não é por serem melhores - os jornalistas desportivos até têm de ter um estofo superior aos dos seus colegas «convencionais»: é por terem mais espaço de manobra.

A coluna-Gestapo é a síntese dessa lógica. Os jornalistas usam aqueles 1000 caracteres para apaziguar os ânimos, para agradar a determinadas franjas de adeptos (de preferência ao maior número possível de adeptos), para transmitir determinadas mensagens que lhes são veiculadas especificamente pelas estruturas de comunicação dos clubes, ou para ganhar lastro negocial que lhes permita, noutras situações, pedir um pouco mais do que o normal, ter um acesso especial ou, em casos extremos em que vão contra o sistema de relacionamento instituído, argumentar em favor próprio apresentando a sua cumplicidade em casos anteriores.

É normal, por exemplo, ler-se aí considerações ao comportamento dos jogadores, sobretudo durante o período de transferências (veja-se o caso do Rolando), expectativas em relação a novas contratações (Kléber, Izmailov…) ou, mais raramente, críticas a alguns elementos de que a «estrutura» espera mais em termos de rendimento. Quando qualquer uma destas coisas acontece, acontece com o beneplácito ou, quanto muito, com o consentimento, por omissão, dos clubes.

No caso do Porto isso é mais visível, por um lado porque a «estrutura» é mais antiga e mais profissional, e por outro porque, ao contrário do que acontece em Lisboa, os jornalistas são praticamente todos adeptos do clube, e por isso mais permeáveis ao «interesse de Estado», mas a lógica é a mesma.

A coluna-Gestapo destaca-se por fazer opinião, «sustentada», geralmente, nas «notícias» que são, no mesmo dia, apresentadas nas três/quatro páginas seguintes, e por isso é um espaço relativamente importante para os clubes. Aí criam-se temas de discussão, lançam-se lebres, e algumas até acabam perseguidas pelos perdigueiros. A eficácia das máquinas de comunicação clubística – a capacidade de controlar o fluxo da informação e as ideologias de pacotilha que ela serve – pode medir-se, perfeitamente, pelo grau de liberdade crítica real dos jornalistas que escrevem na coluna-Gestapo.

Mas, voltando aos resultados…)

É normal que o Qualquer Coisa Rodrigues use a coluna-Gestapo para deitar barro à parede, mas a leitura que ele fez não é objectiva.

Objectivamente, a verdade é a que se segue. «Tudo o que já foi alcançado», neste momento, é zero. Nada foi alcançado. No ano passado, por esta altura, os resultados do Benfica eram melhores do que os deste ano, e, no fim, segundo a perspectiva instalada, a época foi um fracasso.

Havia cinco pontos de avanço no campeonato, apesar da Taça de Portugal já estar perdida. Estava melhor que este ano, na minha opinião.

Havia um apuramento para os oitavos-de-final da Champions. Muito melhor que este ano.

Um apuramento para as meias-finais da Taça da Liga. Igual a este ano.

E o que havia, como se comprovou, era o mesmo que este ano: por enquanto, nada.

Falemos em hipóteses – uma tentativa de unir subjectividade e objectividade, que não me agrada muito, mas, ainda assim, possível e relevante.

O Benfica tem 25 por cento de hipóteses de ser campeão nacional, 90 por cento de hipóteses de ganhar a Taça de Portugal, 30 por cento de hipóteses de ganhar a Taça da Liga (se o Porto for eliminado, como está nos regulamentos), 3 por cento de chegar à final da Liga Europa e 1 por cento de hipóteses de a ganhar.

 A Liga Europa

Comecemos pelo fim. A Liga Europa é uma competição residual, em termos de hipóteses de sucesso intrínseco, na época do Benfica, e potencialmente fundamental em termos de importância dos efeitos secundários que pode gerar.

Com equipas como o Zenit, o Olympiakos, o Leverkussen, o Chelsea, o Nápoles, o Tottenham, o Lyon, o Ajax, o Inter, o Atlético de Madrid ou a Lazio, a passagem à final não é impossível, nem a vitória na final, mas quase, e exigiriam, de um plantel curto como é o do Benfica, um esforço insuportável – já para não falar de uma dose de sorte muito considerável para uma boa parte destas equipas se eliminar entre si.

É um logro, mas é um logro perigoso porque os adeptos do Benfica estão muito predispostos a cair nele e porque o treinador do Benfica tem a ambição de treinar no estrangeiro, e vê nas competições europeias a sua única oportunidade real de isso vir a acontecer.
Além disso, o Jesus é de outro tempo, Lembremo-nos de que ele continua a dizer que ganhou uma competição europeia, a irrisória Taça Intertoto - que no meu tempo era a Taça do Totobola, porque permitia que houvesse apostas durante o Verão. Apesar de ser bem mais velho, o Jesus ainda é do meu tempo: um tempo em que ganhar uma Taça UEFA ou uma Taça das Taças era uma coisa muito importante. Hoje, é só uma coisa apenas relativamente importante. É uma coisa para puristas. Para a «elite pensante» do futebol, é mais importante chegar aos quartos-de-final da Liga dos Campeões que ganhar a II Divisão que é a Liga Europa. Basta ver que, até ao aparecimento da Champions, as equipas portuguesas só chegaram às meias-finais de qualquer dessas competições duas ou três vezes, e que, nos últimos dez anos, praticamente todas as épocas lá vão. Há dois anos, as meias-finais da Liga Europa pareciam as meias-finais da Taça da Liga portuguesa. Até o Sporting lá chega de dois em dois anos, e isso diz tudo.

A Liga Europa será muito mais importante para o campeonato do Benfica, para o bem ou para o mal, do que para a própria Liga Europa – a começar já este fim-de-semana. É uma carta solta no baralho do Jesus, um jóquer que tanto o pode matar como pode virar o jogo a seu favor, dependendo de como este se vá desenrolar. Mas já lá iremos.

 
A Taça da Liga

Da maneira como o cenário se está a montar, a Taça da Liga é a tal competição que os jornais determinaram que o Braga vai ganhar para abrilhantar a «era-Salvador». Segundo o plano, devia ter sido a Taça de Portugal (assim faziam a dobradinha…), mas o futebol é injusto.

Considerando a previsível escassa importância que a meia-final terá, na altura, comparativamente, para um Benfica já desgastado por um Fevereiro com seis jogos; considerando a habitual Sarajevo que o Benfica encontra em Braga; considerando a pouca diferença real de qualidade entre as duas equipas, o Braga jogará a final da Taça da Liga com o Rio Ave (?) e ganhará. Apesar do Peseiro.

Até é bom. Assim que uma das equipas do arco do poder (Porto, Braga, Sporting) ganhar a Taça da Liga, a competição, magicamente, tornar-se-á relevante na comunicação social e deixará de ser a Taça da Cerveja. As equipas honestas, que trabalham, que ganham à custa do suor, e não dos árbitros, não ganham Taças da Cerveja. Nem sequer competem em Taças de Cerveja. Só ganham taças a sério.

Nessa altura, a Taça da Liga começará a valer tanto como a Supertaça Cândido de Oliveira, por exemplo – essa excelsa competição entre duas equipas, disputada antes de começar o campeonato nacional, que, na relação exigência-glória, é a mais valiosa de Portugal, pela simples razão de que, valendo tanto, em termos nominais, como um campeonato nacional, e existindo apenas há trinta e poucos anos, permitiu ao Porto tornar-se no clube mais vitorioso do futebol português, segundo os cânones vigentes de que as competições são todas iguais ao litro.

É claro que há a desvantagem de, quando alguém do trio SPortBra (agora lembrei-me de um wonderbra para três tetas…) ganhar a Taça da Liga, o Benfica já ter uma série delas de avanço. O futebol é injusto. Mas acho que já disse isto.

 
A Taça de Portugal

Não dou como certo que o Guimarães elimine o Belenenses. Há dinâmicas diferentes entre equipas que jogam sempre para ganhar e equipas que jogam para não perder que, às vezes, esbatem diferenças de qualidade. Além disso, não há uma diferença de qualidade assim tão grande entre uma equipa que está em sexto lugar numa I Liga nivelada muito por baixo e uma equipa com 20 pontos de avanço em primeiro numa II Liga muito competitiva.

Mas, com Vitória ou Belenenses, o Benfica tem 90 por cento de hipóteses de ganhar a final. Por um lado porque é muito melhor, por outro porque é a final da Taça, e finalmente porque, provavelmente, na altura em que se jogar a final, a Taça de Portugal será a única coisa que o Benfica ainda pode ganhar nesta época.

Só a história do Jesus, e do pai do Jesus (Virgulino? Armandino? Saturnino?...), da promessa, o folcore todo, mesmo sem o Benfica, já seria suficiente para os jornais decidirem quem é que teria de ganhar a Taça.

Não vai ser o Benfica a ganhar a Taça, vai ser o Jesus. E o homem até merece.

(amanhã há mais…)

4 comentários:

  1. Devias era criticar quem vilipendia o Benfica.

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  2. Prefiro desfazer os castelos de fumo daqueles que mascaram a realidade. Esses é que fazem do meu clube uma coisa fraca. Os meus inimigos são esses. O que é forte resiste, o que é fraco envenena.
    Podes contar comigo para defender o que engrandece o Benfica. Para conversa de chacha, compra o Record.

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  3. Iluminismo desse já há muito, se a ideia é achincalhar se calhar devias mudar para O Jogo.

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  4. Já começas a agourar... Queres me estragar o fim-de-semana?
    Este ano vou estar no Jamor e no Marquês. (E se eu estiver a ser romântico ou ingénuo deixa-me ser porque estou na idade e ... este ano tem de ser e pronto!)

    No outro post disseste que os jogos com o Leverkusen eram bons para rodar jogadores. Não podia concordar mais. Sinceramente, o que vale a Liga Europa?

    Acho que o Benfica, com a segunda equipa, vai ganhar a Braga. è um pressentimento que tenho.

    E deixa de ler pasquins pah...

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